Passeavam há uns minutos sem dizerem nada. As relações entre ambos estavam um pouco tensas. Ela não compreendia como é que alguém que tinha levado nas suas entranhas, que era carne da sua carne e sangue do seu sangue, vinha agora falar-lhe assim. Era uma rebeldia própria da juventude e o entusiasmo acabaria por passar-lhe. Talvez aquelas ideias fossem somente um exacerbado sentimento religioso próprio da idade. Nada para preocupar-se em demasia. A juventude é assim. É um tempo em que se sonha com elevados ideais. Depois, a realidade encarrega-se de “esfriar” os ânimos e, os que foram jovens, acabam por viver como todos os outros viveram. Nem melhor, nem pior.
«Olha para onde pisas» aconselhou-o. «Ainda vais tropeçar nalguma pedra». «Sabe, mãe, assim é a vida sem sentido. Olhar somente para onde pisamos». Ela não esperava uma resposta destas. Voltou a fazer-se silêncio. Ficar calada seria admitir a “derrota”. «E para onde vais olhar então? Para as estrelas?» perguntou com um certo acento irónico de quem deseja finalizar uma conversa que não lhe parecia ter nenhuma saída. «Exactamente. Para as estrelas. Tenho a sensação de que alguém as pôs lá em cima por algum motivo. Talvez seja para que, quando está escuro, não nos esqueçamos de olhar para o Céu».
Será que um cristão deve olhar para o Céu? Não manifesta essa atitude um certo egoísmo da sua parte? Não manifesta essa atitude uma certa indiferença em relação à vida nesta Terra? Em relação aos problemas reais que a todos nos angustiam?
Há uns anos atrás, dizia o então Cardeal Ratzinger que falar do Céu hoje em dia parece exprimir uma certa “fuga da realidade”. Temos receio de o fazer. Temos medo de parecer covardes em relação aos problemas do dia a dia. Um autor pagão chegou mesmo a afirmar, com um certo desprezo pelo Cristianismo, que devemos olhar sobretudo para a Terra e deixar o Céu para os pardais.
O problema é que sem o Céu a vida nesta Terra perde o seu sentido.
Se o Céu está escuro e encoberto por densas nuvens, a vida fica cinzenta e melancólica. As alegrias tornam-se algo passageiro assim como a própria vida. O máximo que nos podem desejar no dia de anos é que vivamos alguns mais. Que desejo tão raquítico e deprimente para alguém que anseia viver para sempre!
Um cristão, ao olhar para o Céu, tem já nesta Terra a alegria da vida eterna. Uma alegria que, como disse Jesus Cristo, nada nem ninguém lhe poderá tirar. Não é uma alegria que vem “depois”. É uma alegria que está dentro. É uma esperança segura de quem sabe que o seu caminhar tem um sentido porque tem uma meta. Olhar para a eternidade leva a dar muito mais importância aos problemas do dia a dia. Leva a sentir a responsabilidade de ajudar os outros de verdade, não só na aparência. Olhar para o Céu recorda-nos que, do modo como vivermos aqui, depende o modo como viveremos depois.
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