Alguns Estados e instituições europeias, à conta de um laicismo que pretende relegar a fé cristã para a intimidade das consciências, ou os esconsos das sacristias, não aceitam que alguém possa, livre e responsavelmente, assumir compromissos definitivos, uma vez que uma tal opção parece contrariar o sacrossanto princípio da liberdade.
É o caso dos esposos cristãos, que contraem canonicamente um matrimónio indissolúvel que, no entanto, o ordenamento jurídico positivo não admite como tal, na medida em que qualquer casamento é legalmente passível de rescisão, até mesmo contra a vontade do cônjuge inocente.
Promova-se, com empenho, o direito à liberdade de todos os cidadãos. Contudo, o reconhecimento formal e efectivo desta exigência decorrente da comum e universal dignidade humana, não deve ficar circunscrito ao volúvel capricho do legislador, ou da moda do politicamente correcto, mas contemplar todas as legítimas modalidades do seu responsável exercício.
Ora um compromisso conjugal definitivo não só não é uma excepção a essa irrenunciável prerrogativa da condição humana, como uma sua excelente e muito meritória realização.
Compete ao Estado garantir que a todos sejam dadas todas as condições necessárias para que as suas opções sejam verdadeiramente livres, mas não lhe cabe impedir aquelas escolhas que, mesmo não devendo ser exigidas a todos, podem legitimamente ser queridas por alguns. Um ordenamento jurídico que proíbe qualquer compromisso sério, como é o que pressupõe uma entrega definitiva, com o pretexto de assim salvaguardar a autonomia dos cidadãos, não é apenas uma lei paternalista, mas uma norma que não respeita a liberdade dos indivíduos e que, neste sentido, é potencialmente totalitária.
Poder-se-ia eventualmente objectar que nada impede que uma pessoa celebre um casamento religioso indissolúvel, mas uma tal observação não colhe porque, para poder fazê-lo, teria que professar alguma religião, o que nem sempre acontece.
Com efeito, o sacramento do matrimónio é apenas acessível aos cristãos, pelo que o indivíduo que o não é seria, por este motivo, descriminado pela sua não crença, o que parece ser manifestamente injusto e talvez até anticonstitucional. Por outro lado, não basta que a lei admita essa possibilidade teórica, mas importa que reconheça, de facto, a sua efectividade jurídica, ou seja, que garanta que o regime conjugal livremente escolhido será depois responsavelmente observado.
É justo que o Estado a ninguém obrigue a casar e é tolerável que admita, no contexto de uma sociedade secularizada, que alguns o possam fazer em regime precário, porque até a Bíblia admitia o repúdio, que Cristo revogou. Mas não é razoável que o ordenamento jurídico não contemple a possibilidade de um matrimónio civil indissolúvel. Portanto, a existência legal de uma união conjugal para sempre deveria ser garantida a todos os cidadãos, quer tenham ou não qualquer filiação religiosa, até porque mesmo os cristãos casados canonicamente carecem do reconhecimento civil da indissolubilidade do seu vínculo conjugal, a que têm direito em nome do princípio da liberdade. É certo que o próprio não se divorciará se não quiser, mas também é verdade que, só se a lei reconhecer eficácia jurídica à indissolubilidade assumida no pacto nupcial, poder-se-á opor eficazmente ao divórcio pretendido pelo cônjuge.
Quando o Estado e as instituições internacionais, que aceitam e até impõem o reconhecimento legal das mais abstrusas e instáveis uniões, não permitem a possibilidade jurídica de um matrimónio civil indissolúvel, não só potenciam a falência da família e da sociedade, como também incorrem na mais insanável contradição porque, em nome da liberdade, combatem uma das suas mais nobres e altruístas expressões.
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