É infalível como o destino: sempre que se conclui um ano surgem, a par
das inevitáveis retrospectivas fotográficas, as profecias para o novo
ciclo. Nas rádios e televisões, nos jornais e nos blogues, não há quem
não dê o seu palpite, mais ou menos sábio ou prudente. Os vaticínios são
de todo o tipo: desde as ponderadas análises dos comentadores
oficiosos, até às aldrabices dos tolos, no seu estado mais puro e bruto.
O que há mais, sobretudo na comunicação social, é profetas de
desgraças, porque a desgraça vende bem. Por exemplo, a esperada pandemia
da gripe A foi manchete, até ao seu estrepitoso malogro. O aquecimento
global deu que falar mas, mais uma vez, a montanha pariu um rato e,
mesmo esse, simplesmente morno. Também a ameaçadora gripe das aves, que
tinha todos os ingredientes para ser a peste bubónica do terceiro
milénio, não resultou, porque as ditas não aderiram, ou porque tinham
sido prevenidas, ou porque já estavam vacinadas. Mas uma catástrofe é
sempre um bom negócio, um óptimo produto mediático e, por isso, os
correspondentes profetas têm sempre assegurada a mais ampla publicidade
para os seus tremendos augúrios.
Dados estes e outros insucessos, há quem prefira apostar em vaticínios
seguros, para garantir o negócio e a fidelização da clientela. Sem cair
no exagero do provérbio – «chuva em Novembro, Natal em Dezembro» – cuja
autenticidade os especialistas em sabedoria popular não confirmam, os
astrólogos cultivam um tipo de profecias deste género. As suas previsões
são sempre cautelosas e infalíveis: «nesta semana, importa cuidar da
sua saúde!». Não se pense que é fácil acertar no horóscopo de um
determinado signo pois que, embora pareça uma verdade de La Palice, na
realidade esconde um profundo conhecimento do futuro. E, por incrível
que pareça, dá sempre certo. Formidável, não é? É o que dá ser a
astrologia uma ciência exacta!
Outro tipo de profecias muito em voga e não menos certeiras, são as
retroactivas. Nestes casos, como o próprio nome esclarece, o prudente
visionário, já não necessariamente um vidente encartado, não se antecipa
ao facto mas, uma vez verificado o acontecimento, afirma triunfalmente:
«eu sempre disse que isto ia acontecer!». Se o não disse logo que teve
essa premonitória intuição, não foi por cobardia ou acanhamento, mas
para poupar aos outros a humilhação correspondente.
Não é menos corrente a modalidade portuguesa, o adivinho lusitano,
vulgus velho do Restelo. Requer-se, para o caso, uma voz grave, cheia de
enigmáticos silêncios, a apontar para fatídicos malefícios: «Isto vai
mal!». E, caso alguém manifeste alguma incredulidade ante o seu
pessimismo crónico, o profeta nacional não só não desiste como insiste:
«Isto está muito mal!». E está tudo dito.
São deste tipo alguns políticos, que nunca conseguiram ser eleitos,
alguns ex-governantes ressabiados por terem sido apeados do poder e que,
por isso, agora barafustam contra o escândalo da governação. Também os
há nas lides desportivas: são os treinadores de bancada que, mesmo sem
nunca terem dado nenhum pontapé na bola, marcam imaginários golos na
grande área do seu lúcido e profético discernimento, ao mesmo tempo que
se insurgem contra a inépcia dos jogadores em campo, pela sua manifesta
incapacidade de realização das suas geniais tácticas. Para já não falar
das menos canónicas referências ao treinador titular, ao árbitro e
respectivas progenitoras.
Decididamente, o nosso problema não é de falta de profecias, nem de
profetas de mau agoiro. Falta apenas quem trabalhe e, já agora, quem
saiba apoiar e animar os órgãos de soberania, a administração pública, a
família, o ensino, as empresas e todos os âmbitos da actividade humana.
Em poucas palavras, a selecção que somos todos nós.
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