sábado, 1 de março de 2014

Entrevista a D. Georg Ganswein sobre o Papa Bento XVI

Por ocasião do 1º aniversário da despedida do Papa Bento XVI (há um ano estávamos em tempo de Sede Vacante), o Senza Pagare apresenta o seu novo layout.
Segue também uma entrevista feita há duas semanas pela Reuters ao Arcebispo Georg Gänswein, secretário do Papa Bento XVI (antes, durante e depois de ser Papa) e Prefeito da Casa Pontifícia.
O texto original, em inglês e italiano, está aqui.
(Papa Bento XVI e o seu secretário pessoal Georg Gänswein no Vaticano, a 16 de Fevereiro de 2013. REUTERS/Alessandra Tarantino/Pool )
Reuters:  Este é um aniversário muito especial para a Igreja, mas também para Bento. Como é que ele está a viver estes dias e como está a sua saúde?
Gänswein: O Papa Bento está em paz consigo mesmo e, penso eu, está mesmo em paz com o Senhor. Ele está bem, mas certamente é uma pessoa que carrega o peso dos seus anos. Ou seja, ele é um homem que está fisicamente velho, mas o seu espírito é muito vivo e muito claro.
Reuters:  Bento nem sempre foi tratado com simpatia pelos media e outros. Por exemplo, algumas pessoas dizem que ele não recebeu os louros por ter introduzido as normas para confrontar o escândalo dos abusos sexuais, quer quando era cardeal, quer quando era Papa. Ele tem algum ressentimento pelos louros que não recebeu, por isto ou por qualquer outra coisa?
Gänswein: Não. É verdade que, humanamente falando, muitas vezes é doloroso ver que o que é escrito sobre alguém não corresponde concretamente ao que foi feito. Mas a medida do trabalho de uma pessoa, da maneira de fazer as coisas, não é o que os mass media escrevem mas o que é justo diante de Deus e diante da consciência.
Reuters:  E mesmo diante da história?
Gänswein:  Sim, mesmo diante da história. Mas o ponto de referência é a consciência e Deus. E, se for justo, no fim a história vai reflectir isso.
Reuters:  O que é que pensa que os juízos a longo prazo sobre Bento XVI vão ser?
Gänswein: Estou certo, mesmo convencido, que a história vai oferecer um juízo que vai ser diferente daquele que uma pessoa lia regularmente nos últimos anos do seu pontificado, porque as fontes são óbvias e a claridade impor-se-à.
Reuters: Pouco antes de resignar, Bento disse que gostava de viver escondido do mundo. Como é que ele passa os seus dias?
Gänswein:  De facto, ele está longe do mundo, mas presente na Igreja. A sua missão agora é, como ele uma vez disse, ajudar a Igreja e o seu sucessor, o Papa Francisco, através da oração. Esta é a sua tarefa principal e mais importante. Mas há 24 horas num dia. Ele estuda, lê, troca correspondência e depois há pessoas que o visitam. Damos passeios a rezar o Terço, ele toca piano várias vezes e tudo isto é feito a uma escala humana para um homem que tem 86 anos de idade.
(O Papa Bento XVI sai, com o seu secretário pessoal, George Gänswein depois da sua última audiência na Praça de S. Pedro no Vaticano a 27 de Fevereiro, 2013.REUTERS / Alessandro Bianchi )
Reuters:  Ele por vezes arrepende-se?
Gänswein:  Não, não tenho visto nada disso.
Reuters:  Qual é a relação entre Bento e Francisco? Eles pedem opiniões um ao outro?
Gänswein:  Desde o início dos inícios houve uma boa relação entre eles e este bom começo desenvolveu-se e amadureceu. Eles escrevem-se um ao outro, telefonam um ao outro, falam um com o outro, convidam-se um ao outro. Vocês sabem que o Papa Francisco já esteve no Mosteiro Mater Ecclesiae (a residência de Bento no Vaticano) várias vezes e o Papa Bento já esteve em Santa Marta (a residência de Francisco). Em vários níveis, há um bom ambiente entre eles.
Reuters: Qualquer pessoa que tivesse sido eleita no conclave de 2005 teria tido dificuldade a seguir um pontificado tão longo e tão cheio de novidades como o de João Paulo II. Acha justo dizer que Bento não teve sorte neste aspecto?
Gänswein: A vossa opinião é, naturalmente, uma observação subjectiva. Estou convencido que o Espírito Santo envia o Papa certo no tempo certo e isto é verdade para João Paulo, para Bento e para Francisco. Depois do pontificado muito longo de João Paulo II, que viveu em plena força nos primeiros 20 anos, antes dos anos de sofrimento que era visível e perceptível, foi escolhido um Papa que vivera ao lado de João Paulo durante 23 anos, como nenhum outro cardeal o tinha feito e que era, talvez, o ajudante mais eficiente e em quem mais confiava. Não diria que o Papa Bento não teve sorte. Depois de um pontificado de 27 anos, teria sido difícil para qualquer pessoa que fosse eleita.
Reuters: [O D. Georg] é, provavelmente, o único prelado de alto nível no Vaticano que tem dois chefes e talvez o primeiro na história que serve dois Papas simultaneamente. Como é que é esta experiência para si?
Gänswein:  Dizem que eu tenho chefes para servir. Num certo sentido isto é verdade e acrescentaria que é possível viver com dois mestres. Eu faço o meu serviço em total harmonia com os dois Papas, tentando ser uma ponte entre os dois pontífices. Até agora tem corrido bem e espero que os dois chefes estejam contentes.
Reuters:  Visto que a palavra pontífice vem da palavra latina para ponte, podemos dizer que você é uma ponte entre duas pontes.
Gänswein:  Isso é uma brincadeira com palavras mas sim, é exactamente isso.

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