domingo, 2 de março de 2014

Homilia de D. Athanasius Schneider nos Jerónimos

No passado dia 16 de Fevereiro de 2014, D. Athanasius Schneider, Bispo Auxiliar de Astana, Cazaquistão, foi aos Jerónimos dar um testemunho sobre a perseguição aos Cristãos pelo regime comunista na antiga União Soviética, na Ásia Central.

No mesmo dia, ele celebrou também a Santa Missa nos Jerónimos. Aqui fica a homilia pregada por ele:
Livro de D. Athanasius publicado em Portugal

"Caros irmãos e irmãs!

Nesta Santa Missa queremos de modo particular exprimir a nossa fé católica, renovar a nossa fidelidade à imutável fé católica, e a nossa alegria de poder crer de modo católico. A expressão mais sublime da imutável fé católica é a liturgia, tal como nos foi transmitida, de um modo orgânico, a partir dos santos Apóstolos. Nós devemos continuar hoje a ter a mesma fé eucarística e a mesmo respeito para com o Santíssimo Sacramento que tiveram tantos Santos durante mais de um milénio, a mesma fé dos nossos pais e avôs; e se nós ou outras pessoas poderem comportar-se do mesmo modo ainda hoje, isso deverá comover-nos profundamente.

“Credo in sanctam catholicam Ecclesiam”. “Creio na Santa Igreja Católica”. Quando professamos a fé na Igreja Católica, professamos a verdade de que Cristo instituiu a Igreja, e que ela é una e única, e que esta Igreja é a Igreja Católica. Cristo fundou a Igreja, não somente sobre o fundamento que Ele mesmo é, mas também sobra a rocha visível, que é o Apóstolo Pedro e cada um dos seus sucessores. Vendo o quadro dos inumeráveis cismas entre os discípulos de Cristo e entre os mesmos bispos durante toda a história da Igreja, verificamos que S. Pedro e seus sucessores, os Romanos Pontífices, mostraram ao mundo toda a verdade das palavras divinas: “Sobre esta pedra edificarei a Minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mateus 16, 18). Desde os tempos antigos, escutavam-se estas palavras: “Ubi Petrus, ibi Ecclesia”, “onde está Pedro, aí está a Igreja”, palavras de Santo Ambrósio. Quem está com Pedro e com os seus sucessores, encontra-se sem dúvida na única Igreja de Cristo. Por essa razão, todos os perseguidores da Igreja e todos os cismáticos de todos os tempos tentaram separar os fiéis da rocha de Pedro, qual é a Cátedra Romana.

O que deu aos mártires e aos confessores a força de sofrer, e sobretudo a força da paz da alma no meio das condições desumanas dos cárceres e dos campos de concentração, foi a Santíssima Eucaristia. Quando lemos os testemunhos das suas vidas, descobrimos também nós, hoje, o exemplo da profundíssima fé no mistério da Santíssima Eucaristia, do ardente amor e da delicada reverência para com este máximo mistério da nossa fé, porque eles sabiam: a Eucaristia é o Senhor. “Dominus est”. E com isto está tudo dito.

Desejo citar alguns dos confessores de Cristo num dos mais horríveis campos de concentração estalinistas, das ilhas Solovetskin, no Mar Branco. O Pe. Donato Nowitsky escreveu: “Durante muito tempo celebrávamos a santa Missa no sótão, o tempo todo de joelhos, porque era impossível estar de pé. O Pe. Nikolaj ia todos os dias para a capela. Depois de um dia de desgastantes trabalhos forçados, levantou-se as cinco da manhã, tomou uma pequena quantidade de vinho, misturado com uma gota de água, e um pedaço de pão, e correu para a capela. As nossas celebrações da Eucaristia eram momentos de grandes alegrias espirituais. Agradeço a Deus que eu tenha podido estar nas ilhas Solovki. Não raramente experimentei, naquele horrível lugar, o sopro do paraíso e raras e grandes alegrias. Seguimos este princípio: olhar todas as coisas com os olhos da fé e alegrar-nos sempre na consciência de servir a verdade e gozar dela em cada momento».

O Pe. Donato Nowitsky deixou o seguinte comovente testemunho da sua própria ordenação sacerdotal, realizada em segredo: “Havia uma situação própria das catacumbas: na pobre capela estava sentado num simples banco, em vez de numa cátedra, o jovem bispo Boleslaw Sloskans. O bispo oficiava sem mitra e báculo. O seu rosto irradiava uma grande perfeição espiritual e substituía de certo modo estes sinais ordinários do poder episcopal. Na capela sentia-se o aroma da graça. Experimentámos que aqui, nesta terrível ilha, as palavras de Cristo eram cheias de significado real: “Eu estou convosco todos os dias”, “as portas do inferno não prevalecerão contra a Igreja”. Era o dia 7 de Dezembro de 1928. Eu não consegui conter silenciosas e alegres lágrimas, quando o bispo Boleslaw impôs as mãos sobre a minha cabeça dizendo: “Accipe Spiritum Sanctum”, “Recebe o Espírito Santo”, e quando também os outros sacerdotes confessores tocaram a minha cabeça. Sentia que a principal força, com a qual eu podia servir Deus no cárcere, era o santo Sacrifício da Missa. Sentia que Cristo é para sempre meu, e que sou seu servo para aliviar os seus sofrimentos. A minha alma sentia e dizia somente uma coisa: “Meu Senhor e meu Deus”.

Caríssimos irmãos e irmãs, estes exemplos devem comover-nos e encorajar-nos no exercício da nossa santa fé. Para os nossos irmãos mártires e confessores, a Eucaristia era o centro de cada dia e o verdadeiro fim de toda a sua vida. Mesmo nas miseráveis condições das catacumbas, eles demonstraram a máxima atenção e reverência para com a Eucaristia. Nem sequer um detalhe do rito da Missa e dos gestos exteriores consideraram que fossem secundários. Que exemplo para nós, que vivemos na liberdade, ainda na liberdade, tendo tantas possibilidades de celebrar a Santa Missa com solenidade e com toda a riqueza do culto, digno da majestade divina! Queremos competir com eles no modo de celebrar e venerar a Eucaristia. Que exemplo de fé seria se, no meio da crise litúrgica da Igreja latina nos nossos dias, em todas as Santas Missas, em todo o orbe, os católicos recebessem a santa Comunhão de joelhos e na boca: que durante a liturgia da Missa fossem sempre mais os sinais de adoração, do silêncio, da sacralidade da música; se o sacerdote e os fiéis estivessem orientados na alma e no corpo para o Senhor, olhando juntos para o Crucifixo e para o rosto de Cristo no Sacrário, no centro da igreja. Deste modo a fé poderia crescer e tornar-se mais católica, sempre mais eucarística.

A liturgia é o rosto mesmo de Cristo, para o qual todos devem ser orientados. A verdadeira renovação da Igreja nos nossos dias acontecerá somente quando os fiéis, e em primeiro lugar o clero, aspirarem sinceramente à perfeição da caridade. Contudo, não haverá santidade e caridade para com o próximo sem a adoração reverente de Deus, isso é sem uma liturgia reverente e cristocêntrica. A santidade e a verdadeira caridade para com o próximo não existirão sem que a Igreja dos nossos dias se ajoelhe com amor e tremor diante de Cristo, real e substancialmente presente no mistério eucarístico.

Que toda a vida da fé e toda a liturgia sejam permeadas com a reverência diante da majestade de Deus, sabendo que tudo vem d’Ele, e que sejam ao mesmo tempo permeadas com a alegria de podermos aproximar-nos de Deus, que alegra a juventude da nossa alma. A santidade e a beleza celestiais da liturgia da Missa proclamam esta verdade e nos confortam nela: “Credo in Ecclesiam catholicam apostolicam et romanam”, “Creio na Santa Igreja católica romana”. Amen. 

 in adtelevavi.blogspot.com

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