Recentemente, no grupo do Facebook "O Católico responde", foi feita uma pergunta cuja resposta ajuda a perceber alguns pontos importantes da doutrina Católica. Por essa razão partilhamo-la aqui no Senza para edificação e formação de todos os leitores.
Estas respostas são muito boas para usar em conversas que normalmente surgem em jantares de amigos, em intervalos no trabalho ou outras situações parecidas!
Resposta do Bernardo Motta:
Caro Manuel Maria P. Valle,
A sua questão é bastante complexa, e não pretendo responder de forma definitiva, mas apenas complementar o que o Pedro Gabriel aqui escreveu.
Você diz:
"Devo concluir pelas vossas respostas, que de facto, não é possível estabelecer uma noção de moral para o Catolicismo."
Não foi essa a conclusão do comentário do Pedro Gabriel. Ele apenas disse, e com razão, que a religião católica não se reduz a uma moral. Você perguntou:
"É de alguma forma possivel reduzir a religião Católica ao nivel de uma filosofia moral" ?
E a resposta é a que o Pedro deu, pelas razões que ele deu: não é possível reduzir a religião católica ao nível de uma moral.
Mas é claro que há uma moral no catolicismo. Ele não se reduz a ela, mas ele contém uma moral.
Acerca da sua Questão 2, eu não tenho a menor das dúvidas de que se pode encontrar no catolicismo uma moral consistente e abrangente que, como disse o Pedro, é uma moral sempre em crescimento no que diz respeito à aplicação dos mesmos princípios universais a cada época histórica. Alguns desses princípios morais universais são acessíveis pela via da razão natural, e outros são acessíveis por revelação, nomeadamente pela revelação presente nas Escrituras e na pessoa de Jesus Cristo.
"1- Da biblia, que diverge do antigo para o novo testamento, e obedece às diferentes interpretações dos Teólogos"
Os teólogos não fazem parte do Magistério da Igreja Católica. Na Igreja Católica, a função de ensinar doutrina e moral pertence ao Papa e aos Bispos unidos ao Papa, sendo que o Papa é a cabeça do colégio episcopal.
"2- Dos Concilios que tentam estruturarva doutrina e actualizar a mesma de acordo com os dogmas e o periodo temporal"
Os concílios são constituídos por Bispos e governados pelo Papa, pelo que são um instrumento do Magistério. Dos concílios podem emanar novas aplicações da doutrina e da moral a novas situações. Dos concílios também podem emanar melhores formulações da doutrina e da moral de sempre. Por exemplo, a proclamação de um dogma consiste na formulação definitiva de uma doutrina que a Igreja sempre defendeu, mesmo que anteriormente o fizesse de forma pouco clara ou não definitiva.
Nem os dogmas são inventados ou criados, nem a moral é inventada ou criada. A compreensão da doutrina amadurece (e então surgem os dogmas como sinal desse amadurecimento), e novos casos surgem para os quais é preciso aplicar a doutrina e a moral de sempre.
"3- Dos Papas através das enciclicas, apresentando a sua visão pessoal sobre a religião, os dogmas e as doutrinas. É uma espécie de árbitro entre as duas primeiras fontes de fé /moral."
Os Papas podem dar a sua visão pessoal quando assim o entenderem acerca de todo o tipo de temas, menos sobre doutrina e sobre moral, porque nesses casos o magistério papal não consiste numa visão pessoal de um determinado Papa, mas sim no ensinamento da Igreja. Por isso mesmo, os ensinamentos magisteriais de um Papa em matéria de doutrina ou de moral são infalíveis.
Na Igreja Católica, só há duas fontes de doutina/moral: a Revelação (Escrituras, Profetas, Jesus Cristo) e a Tradição (Bispos, Papas, Igreja).
"Observação: Não sei se é possivel extrair daqui alguma coisa.
1- Isto porque se aceitar a biblia como um todo, enquanto fonte de moral, entao vamos cair em contradições e acabar por defender a barbárie."
A Bíblia, se a tomamos apenas como conjunto de textos, abdicando de um intérprete, não tem valor pedagógico. A interpretação da Bíblia é sempre mediada pela Tradição da Igreja. Se eu me meter a ler a Bíblia fora da Igreja, corro imensos riscos de cometer interpretações erradas. É essa tradição que nos permite entender os textos bíblicos à luz do caminho percorrido pela Igreja com a assistência do Espírito Santo.
Outro detalhe importante: os textos bíblicos são de vários tipos. E se é verdade que podemos retirar ensinamentos morais de textos de tipo sapiencial (Salmos, Sabedoria, etc.), não é trivial retirar ensinamentos morais de textos históricos. Por exemplo, quando o Antigo Testamento relata os pecados do Rei David, não vamos tomar tais pecados como lição moral, certo?
"2- Se por outro lado, assumirmos que os livros mais recentes presentes na biblia são aqueles que devem ser considerados, como fonte de moral, estamos a admitir que a noção de moral para o catolicismo é contigente e temporal. O que por sua vez demonstra que o Catolicismo não tem ainda uma moral definida."
É preciso ver o que a Igreja sempre ensinou acerca dos textos do Antigo Testamento. Muitas vezes contrasta-se a moral do Antigo Testamento com a moral do Novo Testamento, pegando apenas nos textos lidos "à letra", o que é um erro. É preciso ver o que é que o Magistério da Igreja escreveu ao longo de 20 séculos sobre os textos do Antigo Testamento. O significado e as lições morais que se podem extrair desses textos encontra-se na leitura que a Igreja faz deles, e não numa leitura feita por nós, à revelia da Tradição.
As contradições só surgem quando nós começamos a ler a Bíblia à revelia da Tradição. Ora, se lermos TODA a Bíblia à luz da interpretação canónica feita pela Igreja ao longo dos séculos, não vemos contradições, nem nos vemos obrigados a cair no erro de achar que há um fosso moral entre o Antigo e o Novo Testamento.
A perfeição do nosso entendimento da moral vai-se construindo. Estamos, com a ajuda do Espírito Santo, a aprender acerca das verdades morais universais, a descobri-las, e a aprender como as aplicar a casos novos, do nosso tempo.
Mas só cresceremos nessa compreensão se estivermos DENTRO da Igreja, a ler a Bíblia à luz da Tradição da Igreja.
"Não creio que seja possivel admitir a infalibilidade Papal como uma Hipótese filosófica e cientifica minimamente válida para resolver este problema."
A infalibilidade papal em matéria de doutrina e de moral é um facto cabal da doutrina católica. Há vários graus de infalibilidade, e é importante conhecê-los, porque dependendo do tipo de pronunciamento papal, teremos diferentes tipos de infalibilidade.
Nada há de estranho nessa doutrina, se entendermos que não é por mérito do homem que é Pontífice que um Papa é infalível. A infalibilidade não é mérito do homem que é eleito Papa. A infalibilidade é mérito do Espírito Santo, e portanto, quem garante que o Papa não falha em matéria de doutrina e de moral é o próprio Deus, em cumprimento da promessa feita por Cristo de que "as portas do Inferno" não iriam prevalecer sobre a Igreja, ou seja, Cristo prometeu que o Pai da Mentira (o Diabo) não iria imiscuir erros, mentiras e falsidades nos ensinamentos da Sua Igreja.
Espero ter ajudado!
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