Os exames na universidade
oferecem uma oportunidade curiosa de comprovar até que ponto os rapazes são
diferentes das raparigas. Não é só a óbvia complementaridade sexual. Nem só a
força do cabelo, a consistência da pele, o tom da voz. É tudo! Os arqueólogos pegam
num fragmento de osso com milhares de anos e identificam imediatamente se se
trata de um homem ou de uma mulher, porque a constituição dos ossos, dos
músculos, das glândulas... tudo é diferente, até ao pormenor.
À primeira vista, a reprodução
não explicaria tanta diferença. Por exemplo, porque é que a voz das mulheres é
mais aguda que a dos homens?
Os exames da universidade
tornam patentes algumas destas diferenças, difíceis de explicar. A maneira de os
alunos abordarem um problema é tipicamente distinta e, mesmo antes de começarmos
a ler o que escreveram, salta à vista se a letra é feminina ou masculina.
Porquê? Hoje em dia, a maior parte dos alunos aprende a escrever em turmas
mistas, com os mesmos professores. Por que é que, educados da mesma maneira,
não escrevem com a mesma caligrafia?
Porque é que a letra de
uma estudante de Lisboa é mais parecida com a de uma colega que vem de Trás-os-Montes
ou dos Açores, do que com a de um rapaz que estudou na mesma escola primária que
ela e fez o secundário na mesma turma?
O assombro é ainda maior
se repararmos nos alunos estrangeiros. No Técnico há cada vez mais alunos
estrangeiros, algumas cadeiras têm até mais alunos estrangeiros que portugueses
e uma das cadeiras que lecciono só tem tradicionalmente alunos estrangeiros, de
modo que esta base estatística permite tirar conclusões interessantes a nível
internacional. Ora, verifico que as alunas – venham do Canadá, da Suécia, da
Itália, ou de qualquer outro país – têm «letra de rapariga» e que os alunos,
seja de que país for, têm «letra de rapaz».
Já sei que é moda que as
raparigas e os rapazes se arranjem de maneira distinta (por exemplo, nunca vi
um rapaz de saias), mas desconheço qualquer razão desse tipo para explicar o
modo de abordarem os problemas de engenharia, ou terem determinado estilo
caligráfico. Por que é que os rapazes escrevem – sistematicamente – de maneira
diferente das raparigas, constroem as frases de maneira diferente, resolvem os
problemas de maneira diferente?
Um amigo meu, conhecido
na área da Física das Partículas, defende que isto é assim porque Deus quis que
fôssemos diferentes. Segundo ele, a humanidade ficou mais rica com esta
complementaridade e a família torna-se uma imagem mais expressiva da relação
entre Jesus Cristo e a Igreja. A explicação surpreende, mas quando se pensa
melhor vê-se que é absolutamente brilhante. E diz muito acerca de Deus e da
Igreja. Pesquisando no «Google», percebi que o meu amigo andou a ler uns textos
do Papa Francisco e, investigando um pouco melhor, descobri que o Papa
Francisco foi buscar estas ideias à Bíblia, em particular às epístolas de S.
Paulo.
Lamento bastante que seja
assim, porque gostava de ter sido eu a inventar uma explicação tão interessante
para um problema que toca tão profundamente a humanidade. Se ninguém tivesse apresentado
as coisas desta maneira, neste momento eu estaria a escrever uma carta para
Estocolmo: «Ex.mos Senhores, sabendo que me querem entregar os prémios Nobel da
literatura, da medicina, da física e de todas as outras áreas, informo desde já
que as minhas disponibilidades de agenda para receber todos esses prémios são os
dias tal e tal...».
José Maria C. S. André in «Correio dos Açores», «Verdadeiro Olhar», 9-XI-2014
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