segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

A porta

Diante de uns milhares de padres, em Roma, o Papa Francisco reconheceu que era difícil acompanhar todo o magistério eclesiástico e que importa sobretudo captar os grandes temas de cada época. E, nos nossos dias – explicou-lhes Francisco –, sobressai o anúncio da misericórdia de Deus. Sempre foi central, mas agora mais.


Em Outubro de 1937, Deus confiou esta mensagem à freira Maria Faustina Kowalska. João Paulo II assumiu o conteúdo dessas revelações, canonizou esta freira, transformou o Domingo a seguir à Pascoa no Domingo da Misericórdia e deu um cunho especial ao pontificado, que se nota particularmente na Encíclica «Dives in misericordia» ([Deus] Rico em misericórdia). Bento XVI prosseguiu na mesma linha, logo desde a sua Encíclica programática «Deus caritas est» (Deus é amor) e Francisco comentou que se limita a seguir os seus predecessores.

Contrariando um pouco a humildade do Papa, parece-me que há mais do que uma herança maravilhosa recebida dos antecessores. Quando Deus foi buscar o Cardeal Bergoglio à longínqua cidade de Buenos Aires, ele já trazia este lema, como chave do seu ministério de bispo e agora de Papa: «Miserando atque eligendo». A frase (que se traduz por «olhando com misericórdia e escolhendo-o») significa que a vocação é um olhar de misericórdia. É um convite à conversão, a ser perdoado. Quatro dias depois da eleição, numa homilia sobre a conversão e o sacramento da Confissão, Francisco declarou: «A mensagem de Jesus é a misericórdia. Na minha opinião, digo-o humildemente, é a mensagem mais forte do Senhor».

Estas observações não se excluem. As revelações de Santa Faustina Kowalska são para levar a sério, os ensinamentos de João Paulo II e de Bento XVI têm grande valor e é evidente que a sensibilidade de Francisco joga um papel importante no programa da Igreja para o próximo ano: «Pensei muito em como a Igreja poderia tornar mais evidente a sua missão de testemunhar a misericórdia. Este caminho começa com a conversão espiritual. Por isso quis instituir um Jubileu extraordinário, centrado na misericórdia de Deus. Será um Ano Santo da Misericórdia».

Antiquado? Francisco encolhe os ombros: «Com convicção, ponhamos novamente o sacramento da Reconciliação no centro, porque permite tocar sensivelmente a grandeza da misericórdia».

João XXIII e Paulo VI confiaram o Concílio Vaticano II a Nossa Senhora e Francisco quer fazer exactamente o mesmo. O Concílio concluiu-se propositadamente na festa da Imaculada Conceição e o Ano da Misericórdia abrirá nessa mesma festa.

A Imaculada é o projecto inicial de Deus, que nos sonhou imaculados, puros, cheios de beleza, no corpo e na alma. O pecado de Adão e Eva e os nossos pecados mancharam essa beleza, mas o pecado nunca tem a última palavra. Ao escolher a festa da Imaculada Conceição, Francisco quer mostrar que cada um de nós tem de ir, como Nossa Senhora, ao encontro do sonho original de Deus. Ela leva-nos a ser perdoados, a recuperar a beleza.

Explica o Papa: «O Ano Santo abrir-se-á no dia 8 de Dezembro de 2015, solenidade da Imaculada Conceição. Deus não quis abandonar a humanidade à mercê do mal. Por isso, pensou e quis Maria santa e imaculada no amor, para que se tornasse a Mãe do Redentor do homem. Perante a gravidade do pecado, Deus responde com a plenitude do perdão».

Este ano vai ser a festa do perdão. Perdoar e ser perdoados. «Bem-aventurados os misericordiosos – disse Jesus –, porque alcançarão misericórdia». Cada um a alcança na medida em que perdoar e acompanhar os que precisam de apoio.

A partir desta terça-feira, 8 de Dezembro, na basílica de S. Pedro e em todo o mundo, a porta da misericórdia ficará escancarada o ano inteiro, convidando os homens a abrirem o coração. Nossa Senhora está nesse caminho, porque ela é a «porta do céu», como lhe chama a liturgia. 

José Maria C.S. André in Correio dos Açores

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