I. As cinco qualidades requeridas para todas as orações.
1. — A Oração Dominical (Pai Nosso), entre todas, é a oração por excelência, pois possui as cinco qualidades requeridas para qualquer oração. A oração deve ser: confiante, recta, ordenada, devota e humilde.
2. — A oração deve ser confiante, como São Paulo escreve aos Hebreus (4, 16): Aproximemo-nos com confiança do trono da graça, a fim de alcançar a misericórdia e achar graça para sermos socorridos no tempo oportuno.
A oração deve ser feita com fé e sem hesitação, segundo São Tiago. (Tg 1,6): Se algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus... Mas peça-a com fé e sem hesitação.
Por diversas razões, o Pai Nosso é a mais segura e confiante das orações. A Oração Dominical é obra de nosso advogado, do mais sábio dos pedintes, do possuidor de todos os tesouros de sabedoria (cf. Cl 2, 3), daquele de quem diz São João (I, 2, 1): Temos um advogado junto ao pai: Jesus Cristo, o Justo. São Cipriano escreveu em seu Tratado da oração dominical: «Já que temos o Cristo como advogado junto ao Pai, por nossos pecados, em nossos pedidos de perdão, por nossas faltas, apresentemos em nosso favor, as palavras de nosso advogado».
A Oração Dominical parece-nos também que deve ser a mais ouvida porque aquele que, com o Pai, a escuta é o mesmo que no-la ensinou; como afirma o Salmo 90 (15): Ele clamará por mim e eu o escutarei. «É rezar uma prece amiga, familiar e piedosa dirigir-se ao Senhor com suas próprias palavras» diz São Cipriano. Nunca se deixa de tirar algum fruto desta oração que, segundo santo Agostinho, apaga os pecados veniais.
3. — A nossa oração deve, em segundo lugar, ser recta, quer dizer, devemos pedir a Deus os bens que nos sejam convenientes. «A oração, diz São João Damasceno, é o pedido a Deus dos dons que convém pedir». Muitas vezes, a oração não é ouvida por termos implorado bens que verdadeiramente não nos convêm. «Pediste e não recebeste, porque pediste mal», diz São Tiago (4, 3).
É tão difícil saber com certeza o que devemos pedir, como saber o que devemos desejar. O Apóstolo reconhece, quando escreve aos Romanos (8, 26): Não sabemos pedir como convém, mas (acrescenta), o próprio Espírito intercede por nós com gemidos inefáveis.
Mas não é o Cristo que é o nosso doutor? Não foi Ele que nos ensinou o que devemos pedir, quando os seus discípulos disseram: Senhor, ensinai-nos a rezar? (Lc 11, 1). Os bens que ele nos ensina a pedir, na oração, são os mais convenientes. «Se rezamos de maneira conveniente e justa, diz Santo Agostinho, quaisquer que sejam os termos que empregamos, não diremos nada mais do que o que está contido na Oração Dominical».
4. — Em terceiro lugar, a oração deve ser ordenada, como o próprio desejo que a prece interpreta.
A ordem conveniente consiste em preferirmos, em nossos desejos e preces, os bens espirituais aos bens materiais, as realidades celestes às realidades terrenas, de acordo com a recomendação do Senhor (Mt 6, 33): Procurai primeiro o reino de Deus e sua justiça e o resto — o comer, o beber e o vestir — ser-vos-á dado por acréscimo. Na Oração Dominical, o Senhor ensina-nos a observar esta ordem: primeiro pedimos as realidades celestes e em seguida os bens terrestres.
5. — Em quarto lugar, a oração deve ser devota.
A excelência da devoção torna o sacrifício da oração agradável a Deus. Em vosso nome, Senhor, elevarei minhas mãos, diz o Salmista, e minha alma é saciada como de fino manjar. A prolixidade da oração, no mais das vezes, enfraquece a devoção; também o Senhor nos ensina a evitar essa prolixidade supérflua: Em vossas orações não multipliqueis as palavras; como fazem os pagãos, (Mt 6, 7). S. Agostinho recomenda, escrevendo a Proba: «Tirai da oração a abundância de palavras; no entanto não deixeis de suplicar, se a vossa atenção continua fervorosa». Esta é a razão pela qual o Senhor instituiu a breve oração do Pai Nosso.
6. — A devoção provém da caridade, que é o amor de Deus e do próximo. O Pai Nosso é uma manifestação destes dois amores.
Para mostrar nosso amor a Deus, chamamo-Lo «Pai» e para mostrar nosso amor ao próximo, pedimos por todos os homens justos, dizendo: «Pai Nosso», e empurrados pelo mesmo amor, acrescentamos: «perdoai as nossas dívidas»,
7. — Em quinto lugar, a nossa oração deve ser humilde, segundo o que diz o Salmista (Sl 101, 18): Deus olhou para a prece dos humildes.
Uma oração humilde é uma oração que certamente será ouvida, como nos mostra o Senhor, no evangelho do Fariseu e do Publicano (Lc 18, 9-15) e Judite, rogando ao Senhor, dizia: Vós sempre tivestes por agradável a súplica dos humildes dos mansos. Esta humildade está presente na Oração Dominical, pois a verdadeira humildade está naquele que não confia nas suas próprias forças, mas tudo espera do poder divino.
II. Os bons efeitos da oração.
8. — Notemos que a oração produz três espécies de bens.
Primeiramente, constitui um remédio eficaz contra todos os males. Livra-nos dos pecados cometidos: «Remistes, Senhor, a iniquidade de meu pecado, diz o Salmista (Sl 31,5-6) por isso todo homem santo dirigirá a Vós sua prece». Assim pediu o ladrão sobre a cruz e obteve o perdão, pois Jesus lhe respondeu: «Em verdade vos digo, hoje mesmo estareis comigo no paraíso». (Lc 23, 43), Do mesmo modo rezou o publicano e voltou para casa justificado (cf. Lc 18, 14).
A oração liberta-nos do medo dos pecados que virão, das tribulações e da tristeza. Alguém está triste entre vós? Reze com a alma tranquila (Tg 5, 3).
A oração livra-nos das perseguições dos inimigos. Está escrito no Salmo 108, 4: Em resposta ao meu afecto me fizeram mal; eu, porém, orava.
9. — Em segundo lugar, a oração é um meio útil e eficaz para a realização de todos os nossos desejos. Tudo o que pedirdes na oração, diz Jesus, crede, recebereis. (Mc 11, 24)
Se não somos atendidos, será porque — ou não pedimos com insistência: é preciso rezar sem descanso (Lc 18, 1) — ou então não pedimos o que é mais útil à nossa salvação. «O Senhor é bom, diz Santo Agostinho, muitas vezes não nos concede o que queremos, para nos dar os bens, que desejaríamos receber, se nossa vontade estivesse bem de acordo com a sua divina vontade». São Paulo é exemplo disso, pois, por três vezes, pediu para ficar livre de um forte sofrimento em sua carne e não foi atendido (cf. II Cor 12, 8).
10. — Em terceiro lugar a oração é útil, porque nos torna familiares de Deus. Que a minha oração suba até vós, como o fumo do incenso, diz o Salmista (Sl 140, 2).
S. Tomás de Aquino in "O Pai Nosso e a Avé Maria"
Tradução: Permanência
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