domingo, 29 de novembro de 2020

A Missa do Papa Pio XII

Às sete horas, Pio XII dirige-se à capela; ajoelha-se no grande genuflexório, onde a sua figura aparece ainda mais esbelta, e prepara-se para o Sacrifício Divino. Dirige-se, então, ao altar e veste os paramentos sagrados. Pronuncia tão claramente as orações do rito que cada sílaba é facilmente compreendida e, ao mesmo tempo, não é dita demasiadamente forte a ponto de incomodar. Iniciam as orações do Introitus. Curvando-se profundamente e colocando a sua alma em cada palavra, recita mentalmente o Confiteor. 

Abre os braços, levanta os olhos e o rosto em direcção ao grande Crucifixo de marfim, particularmente adequado para Pio XII. In medio Ecclesiae aperuit os eius: et implevit eum. A Epístola, o Gradual, o Evangelho adquiriam, pronunciados pelo Santo Padre, uma especial solenidade. Sursum corda! Segue-se o Prefácio. Pode isto ser recitado de maneira mais bela e comovente? Depois, um momento de silêncio.      

O Santo Padre recorda todos aqueles que se confiaram a ele e contam com a sua oração: reza por todos os seus filhos espalhados pelo vasto mundo. Um dia, perguntei-lhe porquê que o seu Memento durava sempre tanto tempo. Respondeu-me: «Pedem-me continuamente orações: o Sacrifício Divino é, precisamente, o momento em que o Pai Eterno não pode recusar nada e eu uso-o da melhor maneira possível». 

A Missa aproxima-se do ponto culminante: rezando com seráfico fervor e com grande paixão, o Santo Padre pronuncia as palavras da Consagração tão lentamente, mas também tão pausadamente, tão ardentes de fé e ricas de amor, que todos os presentes são como que arrastados no sagrado prodígio. Da Cruz, o Eterno Sacerdote olha para o Seu Vigário e concede-lhe o que ele lhe apresenta com fervorosa oração. Novamente, uma longa pausa. Mesmo os entes queridos falecidos não são esquecidos. A Sagrada Comunhão é o momento da união mais íntima com Aquele a quem ele é chamado a imitar e representar na Terra.        

De seguida, os braços abrem-se mais uma vez num amplo abraço voltado para o Crucifixo e a bênção do Vigário de Cristo desce não apenas sobre os presentes, mas sobre o mundo inteiro.           

Pascalina Lehnert, in Pio XII. Il privilegio di servirlo
Publicado em Dies Irae

sábado, 28 de novembro de 2020

A guerra religiosa do século IV e o nosso tempo

A Igreja avança sempre vitoriosa na História, segundo os desígnios imprevisíveis de Deus. Os primeiros três séculos de perseguição atingiram o seu auge sob o imperador Diocleciano (284-305). Tudo parecia perdido. O desânimo foi uma tentação para muitos cristãos, entre os quais houve os que perderam a Fé.

Mas aqueles que perseveraram tiveram a imensa alegria, alguns anos depois, de ver a Cruz de Cristo brilhar sobre o lábaro de Constantino na batalha de Saxa Rubra (312). Esta vitória mudou o curso da História. O Édito de Milão de 313, que concedeu liberdade aos cristãos, derrubou o senatusconsulto de Nero, que proclamava o Cristianismo como “superstitio illicita”. A cristianização pública da sociedade iniciou-se num clima de entusiasmo e fervor. 

Em 325, o Concílio de Niceia pareceu marcar a revivescência doutrinária da Igreja, com a condenação de Ário, que negava a divindade do Verbo. Em Niceia, graças à contribuição decisiva do diácono Atanásio (295-373), mais tarde Bispo de Alexandria, definiu-se a doutrina da “consubstancialidade” da natureza das três Pessoas da Santíssima Trindade. 

Nos anos seguintes, entre a posição ortodoxa e a dos heréticos arianos, fez caminho um “terceiro partido”, o dos “semiarianos”, divididos em várias correntes. Reconheciam certa analogia entre o Pai e o Filho, mas negavam que Ele fosse “gerado, não criado, da mesma substância do que o Pai”, como afirmou o Credo Niceno. Substituíram a palavra homoousios, que significa “a mesma substância”, pelo termo homoiousios, que significa “de substância similar”. 

Os hereges arianos e semiarianos entenderam que o seu sucesso dependeria de dois factores: o primeiro era permanecer dentro da Igreja; o segundo, obter o apoio do poder político – de Constantino, portanto, e depois de seus sucessores, o que de facto aconteceu. Uma crise nunca antes conhecida irrompeu dentro da Igreja e durou mais de 60 anos. 

Ninguém a descreveu melhor do que o Cardeal Newman no seu livro "Os arianos do século IV", publicano em 1833, com o qual conseguiu colher  todas as nuances doutrinárias da questão. Um estudioso italiano, Prof. Claudio Pierantoni, traçou um esclarecedor paralelo entre a controvérsia ariana e a controvérsia sobre a exortação apostólica Amoris laetitia. Mas, já em 1973, Dom Rudolf Graber (1903-1992), Bispo de Regensburg, recordando a figura de Santo Atanásio no décimo sexto centenário da sua morte, comparou a crise do século IV com a do Concílio Vaticano II (Athanasius und die Kirche unserer Zeit: zu seinem 1600 Todestag, Kral 1973). 

Atanásio, graças à sua fidelidade à ortodoxia, foi severamente perseguido pelos seus próprios irmãos e forçado cinco vezes, entre 336 e 366, a abandonar a cidade da qual era bispo, passando longos anos de exílio e de lutas árduas em defesa da fé. Duas assembleias de bispos, em Cesareia e Tiro (334-335), condenaram-no por rebelião e fanatismo. E em 341, enquanto um Concílio de 50 bispos proclamava em Roma a sua inocência, o Concílio de Antioquia, com a presença de mais de 90 bispos, ratificava os sínodos de Cesareia e Tiro, e colocava um ariano no trono episcopal de Atanásio. 

O posterior Concílio de Sárdica, no ano 343, terminou com uma cisão: os Padres ocidentais declararam ilegal a deposição de Atanásio e reconfirmaram o Concílio de Niceia; os orientais condenaram não apenas Atanásio, mas também o Papa Júlio I, mais tarde canonizado, que o apoiara. O Concílio de Sirmio, em 351, procurou um meio termo entre a ortodoxia católica e o arianismo. No Concílio de Arles de 353, os Padres, incluindo o legado de Libério, que sucedera como Papa a São Júlio I, assinaram uma nova condenação de Atanásio. Os bispos foram forçados a escolher entre a condenação de Atanásio ou serem exiliados. São Paulino, Bispo de Trier, foi praticamente o único que lutou pela fé de Niceia. 

Exilado na Frígia, ali morreu em consequência dos maus-tratos sofridos nas mãos dos arianos. Dois anos mais tarde, no Concílio de Milão (355), mais de trezentos bispos ocidentais assinaram a condenação de Atanásio, enquanto outro Padre ortodoxo, Santo Hilário de Poitiers, era banido para a Frígia por sua inflexível lealdade à ortodoxia. 

Em 357, o Papa Libério, vencido pelo sofrimento do exílio e pela insistência de seus amigos, mas também impulsionado pelo “amor à paz”, subscreveu a fórmula semiariana de Sirmio e rompeu a comunhão com Santo Atanásio, declarando-o separado da Igreja romana, pelo uso do termo “consubstancial”, como o testemunham quatro cartas de Santo Hilário (Manlio Simonetti, La crisi ariana del IV secolo, Institutum Patristicum Augustinianum, Roma 1975, pp. 235-236). Sob o pontificado do próprio Libério, os Concílios de Rimini (359) e de Selêucia (359), que constituíam um único grande Concílio representando o Ocidente e o Oriente, abandonaram o termo “consubstancial” de Niceia e estabeleceram um equívoco “meio termo” entre os arianos e Santo Atanásio. A heresia desenfreada parecia ter vencido na Igreja. 

Os Concílios de Selêucia e Rimini não estão computados hoje pela Igreja entre os oito concílios ecumênicos da Antiguidade, mas mesmo assim contaram com até 560 bispos, a quase totalidade dos Padres da Cristandade, além de terem sido definidos como “ecuménicos” por contemporâneos. Foi então que São Jerónimo cunhou a expressão segundo a qual “o mundo gemeu e percebeu com espanto que se tornara ariano” (Dialogus adversus Luciferianos, n°. 19, em PL, 23, col. 171). 

O que é importante ressaltar é que não se tratou de uma disputa doutrinária limitada a alguns teólogos, nem um simples entrechoque de bispos no qual o Papa deveria agir como árbitro. Foi uma guerra religiosa em que todos os cristãos estavam envolvidos, desde o Papa até os últimos fiéis. Ninguém se trancou em seu bunker espiritual, ninguém permaneceu na janela como espectador silencioso do drama. Todos desceram para combater nas trincheiras, em ambos os lados do embate. Não era fácil naquele momento alguém entender se seu bispo era ortodoxo ou não, mas o sensus fidei era a bússola para se orientar. 

Falando em Roma no dia 7 de abril de 2018, o Cardeal Walter Brandmüller recordou que “o sensus fidei age como uma espécie de sistema imunológico espiritual que faz os fiéis reconhecer e rejeitar instintivamente quaisquer erros. Nesse sensus fidei repousa, portanto, independentemente da promessa divina, até mesmo a infalibilidade passiva da Igreja, ou seja, a certeza de que a Igreja, em sua totalidade, jamais poderá incorrer em uma heresia”. 

Santo Hilário escreve que durante a crise ariana os ouvidos dos fiéis que interpretavam em sentido ortodoxo as afirmações ambíguas de teólogos semiarianos eram mais piedosos que os corações dos sacerdotes. Os cristãos que haviam resistido durante três séculos aos imperadores resistiam agora a seus próprios pastores, em alguns casos até mesmo ao Papa, culpados, se não de aberta heresia, pelo menos de grave negligência. 

Monsenhor Graber recorda as palavras do livro Athanasius (1838), do escritor Joseph von Görres (1776-1848), publicado na época da prisão do Arcebispo de Colônia [um lance da Kulturkampf bismarckiana], mas que conserva ainda hoje uma extraordinária atualidade: “A terra treme sob os nossos pés. Pode-se presumir com certeza que a Igreja sairá ilesa de tal ruína, mas ninguém pode dizer e conjeturar quem e o quê sobreviverá. Nós, portanto, advertindo, recomendando, erguendo nossas mãos, gostaríamos de prevenir o mal mostrando os seus sinais. Inclusive os jumentos que carregam os falsos profetas encabritam-se, recuam e reprovam com linguagem humana a injustiça daqueles que os espancam e não veem a espada desembainhada (de Deus), que fecha seu caminho (Numeros, XXII, 22-35). Agi, portanto, enquanto é dia, porque à noite ninguém pode trabalhar. De nada serve aguardar: a espera não faz nada além de agravar todas as coisas”. 

Há ocasiões em que um católico é obrigado a escolher entre a covardia e o heroísmo, entre a apostasia e a santidade. Foi o que aconteceu no século IV, é o que está acontecendo hoje.

Roberto de Mattei in Corrispondenza Romana
(Tradução: Hélio Dias Viana,  Fratres In Unum)

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

Supremo Tribunal remove restrições ao culto religioso em Nova York graças ao voto de Barrett

O Supremo Tribunal dos Estados Unidos proibiu Nova York de impor limites à frequência de igrejas e outros locais de culto em áreas designadas como "fortemente afectadas pela pandemia". O voto da nova juíza do Tribunal, Amy Coney Barrett, foi decisivo.

Os votos dos juízes ficaram divididos em 5-4, com a nova juíza Amy Coney Barrett, uma católica devota, demostrando a importância da sua nomeação pelo Presidente Trump, e inclinando a balança para a ala conservadora do Tribunal. Os três progressistas, bem como o presidente do Supremo Tribunal, John Roberts, discordaram.

A sentença representa uma mudança nos critérios do Supremo Tribunal dos Estados Unidos. No início deste ano, quando a predecessora progressista de Barrett, Ruth Bader Ginsburg, ainda estava viva, os juízes também se dividiram em 5-4, mas a favor de deixar em vigor as restrições que afligiam as igrejas da Califórnia e de Nevada.

A decisão indica que as restrições eram especialmente severas para o culto religioso. E acrescenta:

“Os membros deste tribunal não são especialistas em saúde pública e devemos respeitar o julgamento de quem tem especialização e responsabilidade nesta área. Mas, mesmo durante uma pandemia, a Constituição não pode ser deixada de lado e esquecida. As restrições em questão aqui, ao proibir efectivamente muitos de comparecer aos serviços religiosos, atingem o cerne da garantia da liberdade religiosa da Primeira Emenda."

As 6 excomunhões cujo levantamento está reservado à Santa Sé

Existem alguns pecados que, pela sua especial gravidade, são punidos com a excomunhão automática, latae sententiae. O aborto é um deles. Normalmente esses pecados podem ser perdoados e a pena medicial, a excomunhão, levantada pelo bispo local. Mas existem 6 que são reservadas à Santa Sé, como explica o Código de Direito Canónico:  

Cân. 1367 — Quem deitar fora as espécies consagradas ou as subtrair ou retiver para fim sacrílego incorre em excomunhão latae sententiae reservada à Sé Apostólica; o clérigo pode ainda ser punido com outra pena, sem excluir a demissão do estado clerical

Cân. 1370 — § 1. Quem usar de violência física contra o Romano Pontífice, incorre em excomunhão latae sententiae reservada à Sé Apostólica; se o delinquente for clérigo, pode acrescentar-se outra pena segundo a gravidade do delito, sem excluir a demissão do estado clerical.

Cân. 1382 — O Bispo que, sem mandato pontifício, conferir a alguém a consagração episcopal, e também o que dele receber a consagração, incorrem em excomunhão latae sententiae reservada à Sé Apostólica.

Cân. 1378 — § 1. O sacerdote que agir contra a prescrição do cân. 977 (Absolvição do cúmplice em pecado contra o Sexto Mandamento, ou seja um pecado contra a castidade), incorre em excomunhão latae sententiae reservada à Sé Apostólica.

Cân. 1388 — § 1. O confessor que violar directamente o sigilo sacramental, incorre em excomunhão latae sententiae, reservada à Sé Apostólica; o que o violar apenas indirectamente seja punido segundo a gravidade do delito.

Além destes, a Congregação para a Doutrina da Fé acrescentou mais um pecado que tem como consequência a excomunhão automática reservada à Santa Sé: Tentar a ordenação sacerdotal de uma mulher.

quarta-feira, 25 de novembro de 2020

Vontade, liberdade e pureza de coração

A vontade dos seres criados não está feita para ser livre sendo senhora de si própria; está chamada a conformar-se com a vontade de Deus. Se com ela se conformar por submissão livre, é-lhe dado participar livremente no aperfeiçoamento da criação. Se se recusar a fazê-lo, a criatura livre perde a sua liberdade. 

A vontade do homem mantém o livre arbítrio, mas ele é seduzido pelas coisas deste mundo, que puxam por ele e o empurram em direções que o afastam do desenvolvimento da sua natureza tal como Deus a quis, e da finalidade que ele próprio estabeleceu na sua liberdade original. Para além desta liberdade original, perde a segurança da sua resolução, torna-se vago e indeciso, é importunado por dúvidas e escrúpulos, ou fica endurecido no seu desregramento.

Contra isso, não há outro remédio senão seguir a Cristo, o Filho do homem, que, não só obedecia diretamente ao Pai dos Céus, como também Se submeteu aos homens que para Ele representavam a vontade do Pai. A obediência tal como Deus a quis liberta a nossa vontade escrava de todos os laços com as coisas criadas e devolve-lhe a liberdade. É também o caminho para a pureza do coração. 

Santa Teresa Benedita da Cruz (Edith Stein) (1891-1942), carmelita, mártir, co-padroeira da Europa in 'Meditação para a festa da Exaltação da Santa Cruz'

S. Frei Junípero e Amizades fraternas entre Santos

A verdadeira amizade que consta das palavras do próprio Jesus Cristo e que é comentada por, entre outros, S. Bernardo de Claravale e mais profundamente por S. Tomás de Aquino tem sido, em virtude de distorções doentias, evidentemente inaceitáveis, suspeita aos olhos de muitos na vida Sacerdotal e Religiosa, sendo nesses denominadas ‘amizades particulares’. Daí as recomendações insistentes, por vezes exageradas, de resguardo e prudência.

 

No entanto, abundam os exemplos de grandes amizades espirituais entre Santos, por exemplo, S. Francisco de Assis, e Frei Leão (seu confessor), mas também Santa Clara (sua filha espiritual), S. Francisco de Sales e S. Joana de Chantal. S. Francisco Xavier e Santo Inácio de Loyola e tantos mais que poderíamos elencar.

 

O franciscano S. Bernardino de Sena, um Santo excecional, nas suas numerosíssimas pregações era sempre acompanhado de um irmão Sacerdote, uma vez que S. Francisco seguindo à letra os Evangelhos queria que os frades andassem sempre dois a dois. S. Bernardino, um portento de inteligência e de erudição, adaptava os seus sermões ao povo simples, de modo a ser compreendido por todos. Para que as suas audiências não tivessem a mínima suspeição de que nas suas pregações se referia a algum pecado de alguém que já se tivesse confessado, entregava esse ministério ao confrade Sacerdote que sempre o acompanhava[1]. Ora esta comunhão Espiritual entre os dois confrades só se veio a manifestar publicamente, com algum escândalo de outros confrades, aquando da morte do confessor. De facto, o grande S. Bernardino chorou copiosissamente e imparavelmente durante três dias e de tal modo que muitos Irmãos começaram a desconfiar da sua Santidade... É caso para dizer, mas que brutos!

 

S. Frei Junípero amava de coração um frade chamado Attienalbene, pois este seu Irmão possuía em elevadíssimo grau as virtudes da paciência e da obediência. Podia ser sovado o dia inteiro que não se queixava de qualquer injúria. Enviado a terras onde a gentalha era rude e cruel dela recebia maus tratos que suportava pacientemente, sem o mínimo lamento. Nas mãos de Frei Junípero umas vezes ria outras chorava conformando-se ao que ele mandava. Se S. Junípero deparava nele alguma falta, sempre leve, pedia-lhe lágrimas de compunção e arrependimento, se o via triste e acabrunhado suscitava nele o riso de modo a que se sentisse contente e alegre.

 

Um dia, quando Deus foi servido, morreu Frei Attienalbene com odor e fama de grande Santidade, e Frei Junípero, quando o soube, mostrou uma imensa amargura, uma aflição e angústia como nunca tinha sentido por coisas temporais e terrenas. Espontâneo e expressivo como era exclamava em altas vozes: “Ai de mim! Como sou infeliz! Já não me resta bem algum. Todo o mundo se acabou para mim com a morte do meu bondoso e amicíssimo Irmão, Attienalbene”.

À honra de Cristo. Ámen.


Pe. Nuno Serras Pereira


[1] Esta será uma das razões, entre outras mais, pela qual se tornou costume em muitas paróquias que o Pároco chame vários outros Sacerdotes a atenderem confissões nas suas Paróquias. Santa Teresa de Jesus, contrariamente a alguns costumes da sua Ordem, sempre advogou, e levou avante, que nos seus mosteiros as Irmãs pudessem escolher entre vários confessores e Directores Espirituais, talvez não por algumas das mesmas razões por que as Paróquias o fazem, mas precisamente para que cada alma possa dispor do Confessor ou Assistente Espiritual que mais convenha à sua santificação.

Quando S. Frei Junípero foi ajudar a fundar um Convento em Terra Estranha

Eles eram quatro, Frei Junípero e mais três Irmãos que se puseram de acordo nomeando o nosso Santo como o responsável em tratar das coisas necessárias durante a viagem. Chegados a uma terra famintos e sem terem onde pernoitar, começou frei Junípero a bradar: Não há quem nos hospede? Não há quem nos esmole? Não há quem nos agasalhe?

Aquelas gentes que ainda não conheciam o maltrapilho hábito franciscano e surpreendidos com o insólito da gritaria estavam naturalmente apreensivas. Houve, no entanto, um habitante mais ousado que depois de os observar detidamente lhes perguntou quem eram e por que elevavam as vozes daquele jeito. Ao que Frei Junípero retorquiu: ‘Nós somos enormes pecadores e penitentes e buscamos o necessário à vida, mas, realmente, não merecemos que nos acolham, nos hospedem ou façam esmola, porque temos ofendido a Deus com muitos e grandes pecados’. 


Rendido com a ingenuidade, sinceridade e humildade da resposta, tudo inspirado pelo Espírito Santo, recebeu-os com muita alegria e agasalho, dispondo-se, além disso a acolhê-los sempre, e a todos os que pertencessem à sua Ordem.


Prosseguindo viagem os quatros confrades adiantou-se-lhes o demónio em forma humana persuadindo o castelão de uma terra por onde teriam de passar que por ali passariam quatro homens disfarçados com um hábito singular que não passavam de ser perversos traidores.


Quando eles se aproximavam do Castelo logo os soldados investiram ferocissimamente contra eles.  Frei Junípero imediatamente ofereceu o pescoço desnudado à espada que o ameaçava enquanto os três companheiros se prostraram por terra esperando a morte iminente. Vendo o castelão que vinham desarmados desacreditou do que lhe fora dito. Mas, estúpido como Pilatos, que, não obstante, ter reconhecido a inocência de Jesus O mandou flagelar, ordenou que surrassem Frei Junípero. S. Junípero, sempre igual a si próprio no seguimento de Jesus, depois da tareia logo se ergueu, dando os agradecimentos ao castelão, e fazendo-lhe uma reverência, continuou, com seus confrades, o seu caminho para a povoação em que tinham de fundar o convento.


Passado algum tempo, sucedeu que o castelão foi assistir à Missa a esse convento. Frei Junípero, sem ser reconhecido, logo o topou. Informado da sua residência e despojado de bens temporais instou com um amigo que lhe fizesse o favor de lhe enviar um grande dom que fosse digno de presentear a um homem de grande honra que lhe tinha prestado um grande favor. Recebida a prenda, logo a mandou ao castelão instruindo o portador que informasse o destinatário que lhe era enviada da parte de um Frade Menor como reconhecimento e recompensa de uma enorme prova de amizade que em determinada ocasião lhe tinha demonstrado.

 

O castelão confundido, agradeceu ao portador, não imaginando quem o teria oferecido; e curioso, depois do repasto, encaminhou-se onde o convento para se informar do tal frade que o tinha presenteado com um sinal de tamanha amizade. Adiantando-se Frei Junípero, logo confessou ser ele e mais adiantou o seu reconhecimento pela excelência do modo como tinha domesticado o seu inimigo.


Mas que inimigo é esse? perguntou o castelão. Disponho-me inteiramente para fazer sempre o que é do teu agrado. “O meu inimigo - respondeu S. Frei Junípero - é este irmão corpo, que vós domastes muito bem, quando me fizestes espancar no vosso castelo, porque desde então me tem sido mais obediente do que dantes”.


À honra de Cristo. Ámen.


Pe. Nuno Serras Pereira


O que é a Medalha Milagrosa?

Em 1830, Nossa Senhora apareceu três vezes na casa-mãe das Irmãs da Caridade de São Vicente de Paulo, situada na R
ue de Bac, em Paris, à humilde noviça (agora Santa) Catarina Labouré. É assim que a Santa descreve como lhe foi revelada a Medalha da Imaculada Conceição:

“Os Seus pés repousavam sobre um globo branco. Vi-lhe três anéis de diferente tamanho em cada um dos dedos - o maior perto da base do dedo, o médio a meio e o mais pequeno na ponta - decorados com jóias, umas maiores que as outras. As jóias grandes emitiam raios maiores que as pequenas, e que caíam sobre o globo branco a Seus pés. 

Não posso expressar o que vi, a beleza e o resplendor dos raios deslumbrantes. Um halo ovalado formou-se em redor da Santíssima Virgem, dentro do qual estava escrito com letras de ouro: ‘Oh Maria, concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a Vós’. Nesse instante todo o quadro pareceu rodar sobre si, aparecendo o verso da Medalha: um M maiúsculo atravessado na parte de cima por uma barra, na qual repousava uma Cruz; debaixo do M estavam os corações de Jesus e de Maria, um coroado de espinhos e o outro trespassado por uma lança. Doze estrelas emolduravam tudo isto. 

Logo uma voz me disse: ‘Faz uma medalha segundo este modelo. Todos aqueles que a usarem receberão muitas graças; devem usá-la ao pescoço. Serão abundantes as graças para quem a usar com confiança’.”

A frente da Medalha representa Maria Santíssima de pé sobre o globo do mundo, com o pé a esmagar a cabeça da serpente e as mãos estendidas, num gesto de compaixão maternal, para todos os que pedirem a Sua protecção. A oração reafirma o Seu título de “Imaculada Conceição”, dogma que foi infalivelmente definido 24 anos mais tarde pelo Beato Papa Pio IX, no dia 8 de Dezembro de 1854, na sua encíclica Ineffabilis Deus. Os raios de luz das mãos da Senhora simbolizam as graças que Ela anseia outorgar a quem usa a Sua Medalha e a quem Lhe reza.

Em dois anos, com a aprovação do Arcebispo de Paris, as primeiras medalhas foram feitas e distribuídas em França. Imediatamente começaram a chover bênçãos sobre aqueles que a usavam e rapidamente ficou a ser conhecida como “Medalha Milagrosa”.  

Em poucos anos, foram distribuídas aos milhões. Nenhum sacramental da Igreja fez tanto impacto desde o Santo Rosário, com o qual foram derrotados os Albigenses e os Turcos. Faz milagres - literalmente - e parece especializar-se no impossível: a conversão de pecadores endurecidos, o cuidado dos doentes sem esperança. Com exceção da Santa Cruz, nenhum outro símbolo cristão se multiplicou tão amplamente, ou foi instrumento de resultados tão maravilhosos.

Graças concedidas àqueles que as pedem

Nossa Senhora disse a Santa Catarina: “Vem ao pé do Alta, ali se derramarão graças sobre todos, grandes e pequenos, que as pedem. As graças derramar-se-ão, especialmente, sobre aqueles que as pedem”.

Algumas das graças que Santa Catarina sugeriu que as pessoas deveriam pedir a Deus, incluem: 
  • a graça de uma disposição alegre, 
  • a graça de reconhecer e aceitar as provações de cada dia como bênçãos de Deus, 
  • estar satisfeito com o seu estado de vida, 
  • entender e apreciar o Santo Sacrifício da Missa 
  • e, especialmente, amar a Deus como Nossa Senhora O amou quando Ela tinha a nossa idade.

Santa Catarina Labouré íntima da Mãe de Deus

Santa Catarina Labouré - que disse que viu a Virgem Maria “em carne e osso” e que teve o privilégio de se ajoelhar a Seus pés e descansar no Seu regaço, favor que não foi concedido a nenhum outro vidente - nasceu durante o repicar dos sinos do Angelus, no dia 2 de Maio de 1806. A mãe morreu-lhe quando tinha só nove anos de idade. Viram-na então a abraçar a estátua da Mãe de Deus, dizendo: “Agora Vós sereis a minha Mãe!” - e alimentava um desejo ardente de ver Nossa Senhora. Era esse o pedido constante nas suas orações, e ela confiava serenamente que se realizaria.

São Vicente de Paulo visitou-a num sonho aos dezoito anos, e foi aceita na sua comunidade em 22 Janeiro de 1830, com a idade de vinte e três anos.  

Santa Catarina considerou as aparições de um modo adequado: não como um favor pessoal (embora em certo sentido o tenham sido), mas como uma bênção geral para a Humanidade. Considerou-se apenas como “um instrumento” e pediu ao seu confessor que lhe prometesse que guardaria sigilo da sua identidade, segredo que foi guardado durante 40 anos, mesmo das próprias religiosas da sua comunidade.

Santa Catarina também tinha o dom da profecia, e uma das suas profecias, ainda não realizada, refere-se ao grande triunfo de Nossa Senhora: 
“Oh que maravilha será ouvir ‘Maria é a Rainha do Universo…’ Será um tempo de paz, gozo e bênçãos que durará por um tempo bastante longo”.

A oração, simples e poderosa, enviado do Céu da Medalha Milagrosa, deve repetir-se três vezes: “Oh Maria, concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a Vós”. 

RITO de Bênção e Imposição da Santa Medalha da Imaculada Virgem Maria, geralmente chamada “Medalha Milagrosa”  (S.R.C. o dia 19 de Abril de 1895)

    V. A nossa ajuda está no Nome do Senhor,
    R. Que fez o Céu e a terra.
    V. O Senhor esteja convosco.
    R. E com o vosso espírito.

OREMOS - Deus Todo-Poderoso e misericordioso, que através das aparições da Imaculada Virgem Maria na terra, Vos dignastes obrar continuamente milagres para a salvação das almas, abençoai a esta Medalha simbólica, para que aqueles que meditarem Nela piedosamente e devotamente A usarem possam sentir a Sua proteção e obter a Sua misericórdia. Por Cristo Nosso Senhor. Amém.

O sacerdote, então, asperge a Medalha com água benta, e diz ao colocá-la:
Recebei esta Medalha sagrada, usai-a fielmente e tratai-a com a devida veneração, para que a Santíssima e Imaculada Rainha do Céu vos proteja e defenda, e, sempre renovando os milagres da Sua bondade, obtenha misericordiosamente o que com humildade pedis a Deus, para que possais descansar jubilosamente no Seu abraço maternal por toda a vida e na hora da morte. Amém.
O sacerdote continua:
Senhor, tende misericórdia de nós. Cristo tende misericórdia de nós. Senhor tende misericórdia de nós.
    Pai Nosso que estais no Céu ...
    V. E não nos deixeis cair em tentação,
    R. Mas livrai-nos do mal.
    V. Oh Rainha, concebida sem pecado,
    R. Rogai por nós.
    V. Senhor, escutai a minha oração,
    R. E o meu clamor chegue até Vós.
    V. O Senhor esteja convosco,
    R. E com o vosso espírito.

OREMOS - Oh Senhor Jesus Cristo, que Vos dignastes glorificar, por inumeráveis milagres, a Santíssima Virgem Maria, Imaculada desde o primeiro momento da Sua Conceição, concedei a todos os que devotamente imploramos a Sua proteção na terra que possam eternamente da Vossa Presença no Céu. Vós que, com o Pai e o Espírito Santo, viveis e reinais, Deus, pelos séculos e dos séculos. Amém. 

in Pale Ideas 

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Bênção da Cerveja em latim e português

Em Latim:


V. Adjutorium nostrum in nomine Domini.
R. Qui fecit caelum et terram.

V. Dominus vobiscum.
R. Et cum spiritu tuo.

Oremus

Bene+dic, Domine, creaturam istam cerevisiae, quam ex adipe frumenti producere dignatus es: ut sit remedium salutare humano generi, et praesta per invocationem nominis tui sancti; ut, quicumque ex ea biberint, sanitatem corpus et animae tutelam percipiant. Per Christum Dominum nostrum.
R. Amen.

Et aspergatur aqua benedicta.


Em Português:

V. A nossa protecção está no nome do Senhor
R. Que fez o Céu e a Terra

V. O Senhor esteja convosco.
R. E contigo também.

Oremos

Abençoai, Senhor, esta criatura, a cerveja, que da riqueza do grão vos dignastes produzir, para que seja remédio salutar ao género humano; concedei ainda, pela invocação do vosso santo Nome, que quem quer que dela beba receba [de Vós] a saúde do corpo e a tutela da alma.
R. Amém.

E aspergir com água benta.

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

A história da Sede Gestatória

O uso da sede gestatória pelos Papas não era um resquício da crueldade esclavagista dos faraós egípcios ou dos imperadores do Baixo Império Romano. Era, ao contrário, um valioso “serviço” prestado aos devotos que se amontoavam nas cerimónias pontifícias e que se queixavam de não poder ver o Papa quando ele passava abençoando. Não é por acaso o uso da sede era limitado à parte interna das grandes basílicas, a começar pela de São Pedro e a de São João de Latrão, ou em liturgias solenes ao ar livre que atraíssem multidões. 

Em suma, era algo equivalente, na actualidade, aos grandes ecrãs nos eventos nas praças. Não nos esqueçamos que uma grande massa de peregrinos chegava continuamente a Roma, e de lugares cada vez mais distantes, ut videre Petrum, para ver Pedro; e grande seria a sua decepção se, espremidos no meio da multidão, não pudessem ver o rosto do Pontífice e a sua mão abençoando.

Paulo VI disse ao seu amigo Jean Guitton que ficar naquela cadeira era “muito incómodo”, porque balançava, mas de bom grado suportava o desconforto por uma questão de equidade: todos os que desejassem poderiam ver e serem vistos pelo Santo Padre e não apenas aqueles que tivessem privilégios ou gozassem de prioridades. Pelo mesmo motivo, João XXIII utilizou-a inúmeras vezes. Mas João Paulo II e Bento XVI não a quiseram, principalmente para evitar equívocos. No entanto, usaram uma esteira móvel (um “deslocador” apoiado sobre rodas), que não tinha apenas função “ortopédica”, mas também a de melhorar a visibilidade dos fiéis.

Em todo caso, levar sobre os ombros o Santo Padre era uma grande honra, disputada pelas famílias mais eminentes de Roma. E, ainda hoje, apesar de tudo, há uma grande competição em cidades antigas, como Viterbo e Gubbio, para fazer parte do grupo de eleitos que terão o privilégio de levar a cada ano a pesadíssima Macchina di Santa Rosa e os círios, também eles de peso considerável.

Porém, ainda no Vaticano, temos, entre outras coisas, a ordem com a qual Pio IV, em meados do século XVI, regulamentou o serviço da sede, reservando-o apenas aos“cavalheiros romanos”. Com o tempo, o uso tornou-se mais profissional e os sediari pontifici (este é o nome oficial) uniram-se a outra categoria ambicionada e prestigiada, a dos Serviçais do Papa e dos cardeais, criando uma fraternidade que teve a honra de ter uma igreja no Vaticano, ao lado da porta de Santa Ana.

Apenas uma mínima parte do trabalho dos sediari consistia no transporte do Papa sobre os ombros: como já dissemos, recorria-se àquele assento elevado apenas em certas ocasiões. Vestidos com elegante libré, com o escudo de armas papal bordado no peito, eram parte da “Família do Santo Padre” e estavam, portanto, entre os que tinham maior intimidade com ele. Cuidavam e entretinham as visitas nas ante-câmaras e um deles tinha a honra de dormir na sala adjacente à do Papa, a qual dispunha de uma campainha, pronta para avisar caso houvesse qualquer emergência.

Papa João Paulo I sendo levado pelos sediari pontifici, que tiveram a honra de ter uma igreja dentro do Vaticano

Quanto ao transporte nos ombros do trono papal, realizavam-no 12 pessoas, três para cada um dos quatro travessões. Em geral, tratava-se de percorrer umas poucas centenas — normalmente dezenas — de metros, nada difícil para pessoas jovens e robustas, visto que a partir de certa idade se lhes eram reservados apenas os serviços que exigiam pouca mobilidade, nas ante-câmaras. A fadiga de muitos operários ou pedreiros de hoje é muito mais intensa e prolongada, durando até a idade da reforma. 

Sem esquecer o salário adequado e seguro (coisa rara e preciosa em tempos como os actuais) e, sobretudo, da satisfação pessoal: como disse, o serviço directo ao Vigário de Cristo e, principalmente, o esforço para mostrá-lo à multidão de devotos, foi considerado entre os serviços mais prestigiosos e meritórios, digno inclusive de uma recompensa sobrenatural.

Vittorio Messori in 'Il Timone'

terça-feira, 17 de novembro de 2020

Cristianismo e marxismo - Plínio Corrêa de Oliveira

Enquanto o Cristianismo, que é o amor organizado, ensina aos poderosos a justiça para com os direitos dos humildes; a caridade para socorrê-los nas suas horas difíceis... 

Enquanto ensina aos inferiores o respeito aos superiores; a alegria dentro de sua própria condição; a aspiração de elevar-se por merecimento real... 

Enquanto o Cristianismo semeia a paz na harmonia das classes e no concerto admirável resultante do domínio das paixões egoísticas e vis... 

Enquanto o Cristianismo acena para o Alto e promete uma felicidade eterna depois da prova desta vida... 

O marxismo calca aos pés toda dignidade humana, e prega a luta das classes. O ódio ao superior. A revolta. O surto de todas as paixões mesquinhas. A felicidade efémera no gozo da matéria.

É por isso que os bolchevistas, em furiosa sanha, congregam todos os esforços para arrancar a consciência religiosa do povo infeliz. E investem contra a Igreja Católica - o esteio da fé, da esperança e do amor -, a coluna mestra da moral, a guarda da família, a defensora do direito.

'Subtração de valores' in Jornal O Legionário, n.º 143 (15 de Abril de 1934)

Basílica da Imaculada Conceição em Botafogo profanada com ritual Hindu



Eminentíssimo e Reverendíssimo
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro
Dom Orani João Cardeal Tempesta, O.Cist.
 
Considerando o espaço reconhecido aos fiéis pelo direito (CIC Câns. 212, §2 e 3) no que concerne à manifestação de sua preocupação pelo bem da Igreja, nós, fiéis católicos, sobretudo pertencentes à Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, sentimo-nos impelidos em consciência a recomendar a atenção de Vossa Eminência Reverendíssima ao gravíssimo fato ocorrido no dia 31 de outubro, na Basílica da Imaculada Conceição, na Praia de Botafogo, cujo pároco é o Cônego Marcos William Bernardo, professor da PUC-Rio e recentemente nomeado Vigário Episcopal para Cultura. Tratou-se de uma apresentação que exaltou o culto Hare Krishna e a mitologia hindu, promovida pelo projeto “Expo-Religião”, uma iniciativa que visa a colocar em contato, segundo o seu próprio site, diferentes vertentes religiosas, dentre elas a umbanda, catimbó, pajelança, hare krishna, maçonaria, etc.

É sabido que, em toda a sagrada escritura, no sentir do antigo e do novo Israel - a Igreja dos mártires -, um dos pecados mais abomináveis é seguramente a idolatria, e que a unicidade do Deus vivo e verdadeiro, tão zelosamente protegida pela lei e pelos profetas e testemunhada na plenitude dos tempos pelo seu Filho único, nascido de Maria Virgem, é inconciliável com qualquer sombra de politeísmo, panteísmo ou panenteísmo. Ora, na pantomima sacrílega, apresentada no presbitério da dita basílica, com adoração aos falsos deuses, danças indecentes com roupas indecorosas, na presença do Santíssimo Sacramento, deu-se a exaltação de todos esses abomináveis erros inconciliáveis com a nossa Fé e, portanto, com a vontade de Deus, com sua verdade imutável e com a missão da Igreja. 
Considerando os Cânones:
 
1210 — “Em lugar sagrado só se admita aquilo que favoreça o exercício e a promoção do culto, da piedade, da religião; proíba-se tudo quanto for destoante à santidade do lugar. Todavia, o Ordinário, em casos concretos, pode permitir outros usos, não porém contrários à santidade do lugar.” 
 
1211 — “Os lugares sagrados são violados por atos gravemente injuriosos aí perpetrados com escândalo dos fiéis e que, a juízo do Ordinário local, são de tal modo graves e contrários à santidade do lugar, que não seja lícito exercer neles o culto, enquanto não for reparada a injúria mediante o rito penitencial estabelecido nos livros litúrgicos.”
 
1376 — “Quem profana coisa sagrada, móvel ou imóvel, seja punido com justa pena.”
 
Considerando que nesta arquidiocese, por mercê de Deus e da Santa Sé Apostólica, Vossa Eminência Reverendíssima é a pessoa designada para defender o sagrado depósito da fé e conduzir seus súditos à verdade do Evangelho, apelamos para a sua autoridade pastoral, a fim de confirmar a Fé Católica a respeito da sacralidade dos locais de culto, dissipando a confusão doutrinal e o indiferentismo religioso, pondo fim terminantemente a esses abusos, reconfortando os corações dos fiéis e da igreja particular que lhe foi confiada e, desempenhando o encargo de Cristo Bom Pastor, se digne purificar da profanação o lugar sagrado através dos ritos previstos pelas normas litúrgicas e canônicas, assim como reestabelecer a justiça punindo e corrigindo os envolvidos na citada profanação. 
 
Confiando-nos à paternidade de Vossa Eminência Reverendíssima, expusemos as nossas preocupações para com o bem da Igreja e das almas, certos de que esses fatos causaram profunda dor no seu coração de pastor, assim como no coração de seu rebanho. Despedimo-nos rogando a Deus, nosso Senhor, que o proteja e abençoe seu ministério episcopal em nossa arquidiocese com abundantes frutos.
Filialmente suplicamos a sua bênção paternal,
 
Subscrevemo-nos os fiéis católicos.

domingo, 15 de novembro de 2020

Missa Pontifical celebrada pelo Cardeal Burke em substituição da Peregrinação Summorum Pontificum

A Peregrinação Summorum Pontificum deste ano teve de ser cancelada poucos dias antes de acontecer, por causa das limitações impostas pela "pandemia". A Missa Pontifical que seria celebrada pelo Cardeal Sarah na Basílica de São Pedro foi substituída por uma Missa Pontifical celebrada pelo Cardeal Burke na igreja Trinità dei Pellegrini.




















Fotografias: Paix Liturgique

sábado, 14 de novembro de 2020

A desigualdade na Sociedade não impede a busca da perfeição

O Senhor, criando o Universo, ordenou às árvores que produzissem frutos, cada uma segundo a sua espécie; e ordenou do mesmo modo a todos os fiéis, que são as plantas vivas de sua Igreja, que fizessem dignos frutos de piedade, cada um segundo o seu estado e vocação. 

Diversas são as regras que devem seguir as pessoas da sociedade, os operários e os plebeus, a mulher casada, a solteira e a viúva. A prática da devoção tem que atender à nossa saúde, às nossas ocupações e deveres particulares. 

Na verdade, Filoteia, seria porventura louvável se um bispo fosse viver tão solitário como um cartuxo? Se pessoas casadas pensassem tão pouco em juntar para si uma poupança, como os capuchinhos? Se um operário frequentasse tanto a igreja como um religioso o côro? Se um religioso se entregasse tanto a obras de caridade como um bispo? Não seria ridícula uma tal devoção, extravagante e insuportável? 

Entretanto, é o que se nota muitas vezes, e o mundo, que não distingue nem quer distinguir a devoção verdadeira da imprudência daqueles que a praticam desse modo excêntrico, censura e rebaixa a devoção, sem nenhuma razão justa e real. Não, Filoteia, a verdadeira devoção nada destrói; ao contrário, tudo aperfeiçoa. Por isso, caso uma devoção impeça os legítimos deveres da vocação, isso mesmo denota que não é uma devoção verdadeira.

É um erro e até uma heresia querer expulsar a devoção da corte dos príncipes, dos exércitos, da tenda do operário e da vivenda das pessoas casadas. É verdade, Filoteia, que a devoção meramente contemplativa, monástica ou religiosa, não se pode exercer nesses estados; mas existem muitas outras devoções adequadas a aperfeiçoar os que as seguem…

Enfim, onde quer que estivermos, podemos e devemos aspirar continuamente à perfeição.

São Francisco de Sales in 'Introdução à Vida Devota'