quarta-feira, 14 de março de 2012

Hipócra(i)te(a)s - Catarina Nicolau Campos

Devido à ausência do meu obstetra por se encontrar no estrangeiro, e por razões de força maior, dirigi-me a um Hospital privado de Lisboa, (o mesmo Hospital onde, aliás, tive a minha bebé e fui tratada de um modo muito digno e cuidado), para ser observada nas Urgências.

Fui atendida por uma médica na casa dos 30, que eu não conhecia, e que começou a consulta com uma pergunta simples, “qual é a contracepção que usa?”

Julgo que a minha resposta “nenhuma” foi a pedra de toque para o que se passou a seguir. Perguntou-me porquê, já com um ar horrorizado, e retorqui-lhe que não tinha qualquer interesse em fazê-lo. A partir daí a conversa mudou, e tudo o que disse esta médica desde então foi sempre ou num tom irónico e irado, ou então num tom ameaçador.

Dado que tive uma cesariana há pouco tempo e é aconselhável um intervalo de um ano e meio em relação à próxima gravidez, questionou-me acerca do método que utilizava. Expliquei-lhe que era o método natural, aquele que implicava abstinência sexual durante o período fértil. Drama dos dramas.

Decidiu discorrer então sobre a ineficácia, segundo o que ela tinha aprendido, claro está, do meu método, referindo que esse era o método utilizado pelas nossas avós, que tinham 13, 14 , 15 filhos. (Duvido, com toda a reverência que tenho pelas nossas matriarcas, que soubessem o que era o muco cervical, e quem me dera a mim ter 15 filhos, mas com médicos assim é sempre a aprender).

Voltou a inquirir porque razão eu não tomava a pílula ou não usava o preservativo. Disse-lhe então que procurava que o meu casamento fosse construído sobre o amor, e que portanto estávamos abertos à vida.

“Os bebés são muito bem-vindos lá em casa. E, consecutivamente, nada faremos para destruir a Vida”. Destruir? Sim, disse-lhe eu, destruir a vida, porque a pílula pode ser abortiva. “O quê???” (Olhar ultra escandalizado). E eu ia explicar-lhe como, mas não me deixou. Disse, elevando a voz “aqui a médica sou eu, e portanto não vai discutir isso comigo e ponto final.”

Claro que no final, as insinuações de fanatismo religioso e o discurso políticamente correcto, mas de sinceridade duvidosa, de que o dever dos médicos é de informar, e que na opinião dela eu estava muito mal informada, mas que enquanto médica nada tinha a ver com as minhas “convicções religiosas ou éticas” imperou.

Entrei ansiosa porque estava doente e desconhecia as causas. Saí triste, desanimada e continuei doente. Sim, porque no meio desta batalha, teve 30 segundos para me dizer que não conseguia ver nada, melhor mesmo era que o meu médico me examinasse quando voltasse.

E contudo, o problema não foi isto ter acontecido comigo. O problema é que isto, e pior, acontece nos hospitais todos os dias, com raparigas que não têm a resiliência que adquiri em alguns anos de luta pela Cultura da Vida. Nem têm que ter. O que têm, e temos todos que ter, por direito, é médicos bem formados, científica e humanamente.

Médicos que saibam respeitar os doentes que assistem, sem se colocar numa posição de hegemonia que não tem qualquer fundamento. Entender que a Medicina, tal como as restantes profissões, é um serviço à Vida, é mister na sociedade hodierna. E há médicos assim, justiça seja feita. Mas também os há assado, e tivesse sido outra rapariga, provavelmente teria saído das urgências aviada de pílulas e preservativos, coisa que me custa a crer que cumpra o objectivo da Medicina..

Ou seja, há os de Hipócrates e os hipócritas, e desses não deve rezar a História.


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3 comentários:

Anónimo disse...

A minha médica também ficou de olhos em bico quando lhe disse que utilizava os métodos naturais.. mas, graças a Deus, calou-se e não deu a sua opinião...
Realmente fazem-nos sentir bichos raros

Bernardo Motta disse...

Uau!
Grande testemunho, Catarina.
Muito obrigado.
Que bom que seria se mais mulheres dessem este tipo de testemunho.

Um abraço,

Bernardo

Paulo Pereirinha disse...

De facto é triste, mas, salvo raras excepções, é a realidade Portuguesa! Talvez seja bom trazer na carteira uma cópia dos artigos (em Inglês) cujos links se encontram abaixo.
De qualquer forma, para funcionarem bem, é muito importante uma formação eficaz e acompanhamento inicial por uma monitora (www.familiaesociedade.org)

Cumprimentos, Paulo Pereirinha

- www.fertilityuk.org/nfps841.html

www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1678728/pdf/bmj00039-0035.pdf

- P. Frank-Hermann, J.Heil, C. Gnoth, et al. “The effectiveness of a fertility awareness based method to avoid pregnancy
in relation to a couple’s sexual behaviour during the fertile time: a prospective longitudinal study,”Human Reproduction, 2007, 1-10
Este último reconhece, como muitos antes, uma eficácia do método sintotérmico de 99,6% (method effectiveness) e da utilização prática de (user effectiveness) de 98.2%"
http://humrep.oxfordjournals.org/content/early/2007/02/20/humrep.dem003.full.pdf .