Há duas frases tradicionais que sintetizam de maneira admirável a necessidade da Fé Católica para agradar a Deus, entre as quais há uma bonita relação de paralelismo que faz com que, uma vez que as tenhamos aprendido (talvez, numa catequese infantil), delas não nos esqueçamos mais. Uma: não pode ter Deus por Pai no Céu quem não tem a Igreja por Mãe na Terra, de São Cipriano de Cartago (De Ecclesiae Catholicae unitate, 6). A outra: quem não tem a Virgem Maria por Mãe, não tem Deus por Pai, de (certamente entre outros) S. Louis de Montfort (Tratado da Verdadeira Devoção, 30).
A Virgem Mãe de Deus e a Igreja, longe das quais não é possível encontrar a Nosso Senhor Jesus Cristo! A Igreja Católica e a Santíssima Virgem, cuja maternidade é essencial àqueles que se pretendam filhos de Deus neste mundo e no vindouro! As frases podem soar um pouco politicamente incorretas nesta época de caricata tolerância religiosa em que vivemos (como se “tolerância” fosse sinônimo de dizer “está tudo muito bem e qualquer coisa é a mesma coisa”); não obstante, são profundamente verdadeiras e atravessam os séculos com o mesmo vigor original – uma vez que obtêm a sua força do sagradoDepositum Fidei, que não muda ao sabor dos ventos de opiniões de cada momento histórico.
Quem quer ser filho de Deus tem que ser filho da Igreja, quem quer ser filho de Deus precisa ser filho da Virgem Maria: é o que dizem os santos de todos os tempos. Trata-se, perceba-se, de uma forma indireta de repetir o dogma – mil-vezes odiado! – de que fora da Igreja não há salvação. É a mesma coisa: dizer que é preciso ser filho da Igreja e filho da Virgem Santíssima é o perfeito equivalente (*) de dizer que é necessário ser Católico Apostólico Romano. Hoje parece ser um pecado imperdoável repetir que fora da Igreja Católica não é possível encontrar salvação. Contudo, parece que o mundo ainda se permite ouvir que é mister ser filho da Igreja e da Virgem Maria.
[(*) A primeira parte – filho da Igreja – exclui, sem sombra de dúvidas, todos os não-cristãos. A Igreja, mesmo em sentido lato, é uma instituição cristã por essência e sequer se concebe usar o mesmo termo para se referir às (eventuais) estruturas institucionais de religiões outras que o Cristianismo. A segunda parte – filho de Maria – exclui, inequivocamente, os protestantes, ao menos a imensíssima maior parte dos protestantes que desconhecem a veneração dos santos – e, em particular, o culto de hiperdulia que é devido à Santíssima Virgem Mãe de Deus. Sobram, talvez, expandindo a interpretação, os cismáticos orientais, que perfazem Igrejas Particulares e guardam a veneração devida à SSma Virgem. Este sentido é, parece-me, o único em que talvez seja possível afirmar imperfeita a equivalência entre as duas sentenças e o nulla salus. Mesmo assim, elas abarcam a esmagadora maior parte daquilo a que se refere o dogma – e, portanto, dizê-las é já dizer muito.]
Onde ressoam, ainda hoje, essas expressões [que se diriam] tão anacrônicas?! De que obscuro gueto saem essas pregações [consideradas] tão intolerantes? Não é [somente] na blogosfera ultra-radical ou nas seitas cripto-cismáticas dos saudosistas dos tempos passados. Essas palavras reverberam na Praça de São Pedro e, de lá, para todo o orbe. Quem as pronuncia é o homem que sempre se encontra nas capas dos veículos de imprensa mundo afora. É o Papa Francisco – o Papa mais amado e bajulado pelos inimigos da Igreja de todos os naipes – quem o afirma com todas as letras: é preciso ser filho de Maria! Não existe Cristo sem a Igreja!
Deixemos falar o Papa Francisco (itálicos no original, negritos meus):
E, para além de contemplar a face de Deus, podemos também louvá-Lo e glorificá-Lo como os pastores, que regressaram de Belém com um cântico de agradecimento depois de ter visto o Menino e a sua jovem mãe (cf. Lc 2, 16). Estavam juntos, como juntos estiveram no Calvário, porque Cristo e a sua Mãe são inseparáveis: há entre ambos uma relação estreitíssima, como aliás entre cada filho e sua mãe. A carne de Cristo – que é charneira da nossa salvação (Tertuliano) – foi tecida no ventre de Maria (cf. Sal 139/138, 13). Tal inseparabilidade é significada também pelo facto de Maria, escolhida para ser Mãe do Redentor, ter compartilhado intimamente toda a sua missão, permanecendo junto do Filho até ao fim no calvário.
Maria está assim tão unida a Jesus, porque recebeu d’Ele o conhecimento do coração, o conhecimento da fé, alimentada pela experiência materna e pela união íntima com o seu Filho. A Virgem Santa é a mulher de fé, que deu lugar a Deus no seu coração, nos seus projectos; é a crente capaz de individuar no dom do Filho a chegada daquela «plenitude do tempo» (Gl 4, 4) na qual Deus, escolhendo o caminho humilde da existência humana, entrou pessoalmente no sulco da história da salvação. Por isso, não se pode compreender Jesus sem a sua Mãe.
Igualmente inseparáveis são Cristo e a Igreja, porque a Igreja e Maria caminham sempre juntas, sendo isto exactamente o mistério da mulher na comunidade eclesial, e não se pode compreender a salvação realizada por Jesus sem considerar a maternidade da Igreja. Separar Jesus da Igreja seria querer introduzir uma «dicotomia absurda», como escreveu o Beato Paulo VI (cf. Exort. ap. Evangelii nuntiandi, 16). Não é possível «amar a Cristo, mas sem amar a Igreja, ouvir Cristo mas não a Igreja, ser de Cristo mas fora da Igreja» (Ibid., 16). Na verdade, é precisamente a Igreja, a grande família de Deus, que nos traz Cristo. A nossa fé não é uma doutrina abstracta nem uma filosofia, mas a relação vital e plena com uma pessoa: Jesus Cristo, o Filho unigénito de Deus que Se fez homem, morreu e ressuscitou para nos salvar e que está vivo no meio de nós. Onde podemos encontrá-Lo? Encontramo-Lo na Igreja, na nossa Santa Mãe Igreja hierárquica. É a Igreja que diz hoje: «Eis o Cordeiro de Deus»; é a Igreja que O anuncia; é na Igreja que Jesus continua a realizar os seus gestos de graça que são os sacramentos.
Esta acção e missão da Igreja exprimem a sua maternidade. Na verdade, ela é como uma mãe que guarda Jesus com ternura, e O dá a todos com alegria e generosidade. Nenhuma manifestação de Cristo, nem sequer a mais mística, pode jamais ser separada da carne e do sangue da Igreja, da realidade histórica concreta do Corpo de Cristo. Sem a Igreja, Jesus Cristo acaba por ficar reduzido a uma ideia, a uma moral, a um sentimento. Sem a Igreja, a nossa relação com Cristo ficaria à mercê da nossa imaginação, das nossas interpretações, dos nossos humores.
A Igreja Católica é a fiel depositária de um determinado conjunto de verdades imutáveis, as quais tem o mandato divino de anunciar ao mundo como as recebeu de Cristo – sem as aumentar nem as diminuir. Os dogmas não ficam nunca “ultrapassados”, a Doutrina Cristã não “deixa de valer” jamais. E o Papa – qualquer que seja o Papa! – é o guardião da Fé. Não deveria ser estranho que o Vigário de Cristo agisse como Vigário de Cristo. Nestes tempos que correm, no entanto, e como há um evidente empenho em sequestrar o Papa Francisco, é importante registrar e documentar com bastante cuidado: o Papa Francisco é Papa católico. E, por mais que o desejem os anti-clericais, ele não pode ser outra coisa. Não gostam de ouvir o Pontífice Argentino falar? Que ouçam, portanto, o que fala o Papa Francisco! Que o ouçam e, ouvindo-o, se convertam. Pois – Franciscus dixit! – não é possível separar Cristo de Sua Mãe Santíssima. Porque – Bergoglio garante! – não se encontra a Cristo fora da Igreja Católica e Apostólica.
Que a SSma. Virgem, Aquela «que deu uma face humana ao Verbo eterno, para que todos nós O pudéssemos contemplar» (Papa Francisco, id. ibid.), rogue pela Igreja, pelo Papa Francisco e por todos nós. Que Ela, de novo e mais uma vez, nos traga o Seu Divino Filho, diante do qual as Trevas não podem subsistir. Que Ela nos possa sempre valer, em meio às tentações desta vida conturbada. Que nos livre, sempre, das ciladas que o Maligno nos arma nestes dias difíceis em que vivemos.
Jorge Ferraz in Deus lo vult
Sem comentários:
Enviar um comentário