É
uma verdade indiscutível que não haverá misericórdia para os soberbos, que para
eles permanecerão fechadas as portas dos Céus e que o Senhor só as abrirá aos
humildes.
Para
convencer-se basta abrir as Sagradas Escrituras, que continuamente nos ensinam que
Deus resiste aos orgulhosos, que é preciso fazer-se semelhante aos pequeninos
para entrar na Sua glória, que quem a eles não se assemelha será excluído e,
por fim, que Deus só dá a sua graça aos humildes.
Não
poderemos nunca convencer-nos adequadamente de grande importância que tem, para
todo cristão e principalmente para todos os que seguem a carreira eclesiástica,
o cuidado de praticar a Humildade e eliminar do seu espírito toda a presunção,
toda a vaidade e todo o orgulho. Nenhum esforço será demasiado para obter o fim
desejado numa empresa tão santa, e, como este fim não pode ser obtido sem a
graça de Deus, devemos pedi-la instante e frequentemente. Todo o cristão
contraiu, no baptismo, a obrigação de seguir Jesus Cristo, e é Ele o modelo
segundo o qual devemos todos regular a nossa vida.
Todo o
cristão contraiu no baptismo a obrigação de seguir os passos de Jesus Cristo,
que é o modelo a que devemos conformar a nossa vida. Ora bem, este Deus
Salvador praticou a Humildade a ponto de se fazer o opróbrio dos homens, para
humilhar a nossa altivez e curar a chaga do nosso orgulho, ensinando-nos com o
seu exemplo o caminho único que conduz ao céu. Para falar com propriedade, esta
é a mais importante lição do Salvador: “Aprendei de mim!”
Se
desejas, pois, ó discípulo do divino Mestre, adquirir esta pérola preciosa, que
é o mais seguro penhor de santidade e o mais certo sinal de predestinação,
recebe com docilidade e executa fielmente os seguintes conselhos:
I
Abre os
olhos da tua alma, e pensa que nada tens para te mover a alguma estima de ti.
De teu só tens o pecado, a debilidade, a fraqueza; e quanto aos dons da
natureza e da graça que estão em ti, assim como os recebeste de Deus, que é o
princípio de todo ser, assim só a Ele deves dar glória.
II
Concebe
por isso um profundo sentimento do teu nada, e fá-lo crescer constantemente no
teu coração, apesar do orgulho que existe em ti. Intimamente, persuade-te de
que não há no mundo coisa mais vã e ridícula que o desejo de ser estimado por
alguns dons que recebemos da gratuita liberalidade do Criador, pois, como diz o
Apóstolo, se os recebeste, por que te glorias como se fossem teus, e não os
tivesses recebido? (1 Cor 4,7).
III
Pensa
frequentemente na tua fraqueza, na tua cegueira, na tua vileza, na tua dureza
de coração, na tua inconstância, na tua sensualidade, na tua insensibilidade
para com Deus, no teu apego às criaturas e em tantas outras viciosas
inclinações que nascem da tua natureza corrompida. Sirva-te isto de grande
motivo para te espantares continuamente no teu nada, e seres aos teus olhos o
menor e o mais vil de todos.
IV
A
memória dos pecados da tua vida passada esteja sempre impressa no teu espírito.
Nenhuma outra coisa consideres tão abominável como o pecado da soberba, o qual,
posto em comparação, vence qualquer outro, tanto sobre a terra como no inferno:
este foi o pecado que fez prevaricar os anjos no Céu e os precipitou nos
abismos; este foi o que corrompeu todo o género humano, e que fez cair sobre a
terra aquela infinita multidão de males, que durarão enquanto durar o mundo,
ou, melhor dizendo, durarão toda a eternidade.
Ademais,
uma alma maculada pelo pecado só é digna de ódio, de desprezo e de suplícios;
vê, portanto, que estima podes fazer de ti mesmo, depois de tantos pecados dos
quais te tornaste culpado.
V
Considera
também que não há delito, por enorme e detestável que seja, ao qual não se
incline a tua natureza corrompida, e do qual não possas fazer-te réu; e que só
pela misericórdia de Deus e pelo socorro das suas divinas graças foste dele
livre até hoje, segundo aquela sentença de Santo Agostinho: “Não haveria pecado
no mundo que o homem não cometesse, se a mão que fez o homem deixasse de
sustentá-lo” (Arl. C. 15);
Chora
eternamente esse deplorável estado, e toma a firme resolução de te incluíres
entre os mais indignos pecadores.
VI
Pensa
frequentemente que cedo ou tarde vais morrer, e que o teu corpo apodrecerá numa
fossa; tem sempre diante dos olhos o inexorável tribunal de Jesus Cristo, onde
todos necessariamente devem comparecer; medita nas eternas penas do inferno
preparadas para os maus, e principalmente para os imitadores de Satanás, que
são os soberbos. Considera sinceramente que, por esse véu impenetrável que
esconde aos olhos mortais os juízos divinos, estás na incerteza de pertencer ou
não ao número dos réprobos, que eternamente, em companhia dos demónios, serão
remetidos para aquele lugar de tormentos, para serem vítimas eternas de um fogo
aceso pela ira divina. Esta incerteza deve bastar por si só, para conservar-te
numa extrema humildade, e para inspirar-te o mais salutar temor.
VII
Não te
iludas pensando que poderás conseguir a Humildade sem aquelas práticas que a
ela estão ligadas, como os actos de mansidão, de paciência, de obediência, de
ódio contra ti, de renúncia ao teu sentimento e às tuas opiniões, de
arrependimento dos teus pecados e outros actos semelhantes, porque somente
estas armas poderão vencer em ti o reino do amor-próprio, aquele abominável
terreno onde brotam todos os vícios, onde se aninham e crescem desmedidamente o
teu orgulho e a tua presunção.
VIII
Tanto
quanto possível, observa o silêncio e o recolhimento, desde que isso não cause
prejuízo a outrem, e, quando fores obrigado a falar, fala sempre com gravidade,
com modéstia e simplicidade. E se por acaso não fores ouvido, seja por desprezo
ou por qualquer outra causa, não te mostres ressentido, mas aceita essa
humilhação, e sofre-a com resignação e tranquilidade.
IX
Com todo
o cuidado e atenção, evita proferir palavras atrevidas, orgulhosas, e que
indiquem pretensão de superioridade, como também qualquer frase estudada e toda
a sorte de gracejos frívolos; cala sempre tudo aquilo que puder fazer com que
te considerem uma pessoa de espírito e digna da estima dos outros. Nunca fales
de ti sem justo motivo, e nada digas que possa granjear-te honra e louvor.
X
Cuida-te
de não mortificar e ferir a outrem com palavras e sarcasmos; foge de tudo o que
lembra o espírito mundano. Fala pouco das coisas espirituais, e não o faças em
tom magistral e à maneira de repreensão, a não ser que a isso sejas obrigado
pelo teu cargo ou pela caridade: contenta-te com interrogar os que delas
entendem e que sabes que te podem dar conselhos oportunos; porque o querer
fazer-se de mestre sem necessidade é acrescentar lenha ao fogo da nossa alma,
que se consome em fumaça de soberba.
Gioacchino Pecci (Papa Leão XIII) in A
Prática da Humildade
1 comentário:
Lindo texto! Vamos praticá-lo!
Salve, Maria Imaculada!
Ad maiorem DEI Gloriam!
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