Na vizinha Espanha, só agora se trocam os presentes de Natal, à imitação dos Reis, que neste dia ofereceram ao Menino os seus presentes. É aliás a partir deste gesto simpático dos Magos que nasceu a nossa tradição de trocar prendas no dia de Natal. E que bela tradição! De regresso às aulas, faço com os meus alunos uma atividade de Speaking: em inglês, pergunto sobre as férias, as prendas, o dia de Natal. Chego à conclusão que quase todos os alunos receberam as mesmas coisas: roupa, dinheiro, alguns telemóveis. E fico a pensar…
Dar dinheiro a um adolescente ou jovem que esteja a poupar com um fim especial – uma viagem, a carta de condução, a compra de uma máquina fotográfica, etc – é uma ideia feliz. Mas dar dinheiro porque sim, para que a criança pequena o gaste a seu bel prazer, ou apenas porque não temos imaginação para outra coisa, é uma ideia triste. Cá em casa, os mais velhos sabem bem o uso a dar ao dinheiro que recebem. Mas os mais novos ficam confusos: “Podemos comprar todas as gomas que quisermos?” “Podemos ir à loja dos chineses buscar aquelas coisas todas que queremos?” Claro que faz parte da educação ensinar a usar e a poupar dinheiro, mas será esse o objetivo da troca de presentes na noite de Natal?
Oferecer roupa ou acessórios pode ter a sua utilidade, mas também pode ser apenas mais uma forma de reforçarmos a vaidade. Hoje preocupamo-nos pouco com a vaidade infantil, e até a estimulamos. Associada à vaidade vem aquilo a que os psicólogos já chamam de “erotização da infância”. Uma das atitudes mais comuns no Facebook é a colocação de “likes” em fotos que não mostram nada a não ser a própria pessoa numa nova pose. “Que bonita!” “Que sexy!” “Que rapariga gira!” Será mesmo este o caminho para desenvolver a autoestima dos nossos filhos, num mundo cada vez mais obcecado com as aparências? Recordo aqui uma passagem da autobiografia de Santa Teresinha, escrita para a sua irmã mais velha, na altura sua “Madre” em religião:
“Lembro-me de que, enquanto passeávamos na praia, um senhor e uma senhora viram-me correr alegremente à volta do papá e, aproximando-se, perguntaram se eu era dele e disseram que eu era uma menina muito bonita. O papá respondeu-lhes que sim, mas apercebi-me que lhes fez sinal para não me elogiarem… Era a primeira vez que ouvia dizer que era bonita, o que me agradou muito, pois eu não me julgava tal. Vós, minha madre, estáveis muito atenta a que ao pé de mim não houvesse nada que pudesse manchar a minha inocência, sobretudo, a não me deixar ouvir nenhuma palavra capaz de insinuar a vaidade no meu coração.”
Talvez nos choque este excesso de zelo. Mas estes pais zelosos criaram uma família de santos. Nós enaltecemos a vaidade, os pais de santos enaltecem a modéstia. Quem é que hoje fala em modéstia? Que o excesso destes pais nos faça abrandar um bocadinho no nosso excesso contrário.
Fica então a pergunta: que presentes oferecer aos filhos no Natal, quando já passou o tempo das bonecas ou dos carrinhos e ainda não chegou o tempo para ajudar com a carta de condução ou a viagem de finalistas? Que forma encontrar para, no Natal, oferecermos um presente que não afaste os nossos filhos do verdadeiro Presente, o Menino nas palhinhas? Que privilegie os mesmos sentimentos e valores do Presépio? Que não valha pelo valor material, mas pelo que possibilita de abertura ao outro e a Deus e de descoberta dos seus próprios talentos divinos?
Imaginação a trabalhar! Ofereçamos aos adolescentes ou às crianças mais velhas, e de acordo com as nossas possibilidades, um par de patins, uma prancha de skate, uma corda ou um elástico para saltar, uma tabela de basquetebol para interior ou exterior, um bilhete de cinema, um arco e flecha, um boomerang, um instrumento musical, uma caixa de costura, uma máquina de costura, uma caixa de ilusionismo.
“Mas o meu filho não sabe fazer nada disso!” Talvez o nosso presente o encoraje a começar, por que não? Irá certamente encorajá-lo a desligar o computador, o telemóvel ou o televisor para brincar, aprender novas coisas, partilhar momentos felizes com amigos e família, prolongando o tempo de infância até onde o puder prolongar. Cada vez encontramos mais crianças a viver vidas de adolescentes, adolescentes a viver vidas de jovens, jovens a viver vidas de adultos, e depois – surpresa? – adultos a viver como se ainda fossem crianças ou jovens descomprometidos, gastando horas em jogos de telemóvel e trocando de namorado e namorada como nos tempos de liceu.
Ena, Teresa, até onde nos pode levar uma reflexão sobre os presentes de Natal! É verdade. Educar é não deixar nada ao acaso, nem mesmo os presentes de Natal. E as Famílias de Caná educam para a santidade. Nem mais, nem menos…
Teresa Power in familiasdecana.pt
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