quinta-feira, 30 de abril de 2020

Catarina: de analfabeta a conselheira do Papa e Doutora da Igreja


Santa Catarina nasceu em Sena no ano de 1347. Ainda muito jovem, ingressou na Ordem Terceira de São Domingos, sobressaindo pelo seu espírito de oração e penitência. Levada pelo seu amor a Deus, à Igreja e ao Romano Pontífice, trabalhou incansavelmente pela paz e unidade da Igreja nos tempos difíceis do desterro de Avignon. Foi a esta cidade e pediu ao Papa Gregório XI que voltasse quanto antes para Roma, de onde o Vigário de Cristo na terra deveria governar a Igreja. “Se morrer, sabei que morro de paixão pela Igreja”, declarou uns dias antes da sua morte, ocorrida no dia 30 de abril de 1380.

Escreveu inúmeras cartas, das quais se conservam cerca de quatrocentas, algumas orações e elevações, e um só livro, o Diálogo, que relata as conversas íntimas da Santa com o Senhor. Foi canonizada por Pio II e o seu culto estendeu-se rapidamente por toda a Europa. Santa Teresa diz que, depois de Deus, devia a Santa Catarina, muito singularmente, o progresso da sua alma. Pio IX nomeou-a segunda padroeira da Itália e Paulo VI declarou-a Doutora da Igreja.

I. SEM PARTICULAR INSTRUÇÃO, aprendeu a escrever quando já era bastante crescida, e numa existência muita curta, Santa Catarina teve uma vida cheia de frutos, “como se tivesse pressa de chegar ao eterno tabernáculo da Santíssima Trindade”(1). Para nós, é um modelo de amor à Igreja e ao Romano Pontífice, a quem chamava “o doce Cristo na terra”(2), e de clareza e valentia para se fazer ouvir por todos.

Os Papas residiam naquela altura em Avignon, e Roma, o centro da cristandade, ia-se transformando numa grande ruína; como é evidente, tal situação acarretava inúmeras dificuldades à Igreja universal. E o Senhor fez com que Santa Catarina compreendesse a necessidade de que os Papas voltassem à sede romana para darem início à ansiada e imprescindível reforma. E ela correspondeu: orou incansavelmente, entregou-se à penitência, escreveu ao Papa, aos cardeais, aos príncipes cristãos...

Ao mesmo tempo, proclamou por todo o mundo a obediência e o amor ao Romano Pontífice, acerca do qual escreve: “Quem não obedece a Cristo na terra, àquele que está no lugar de Cristo no Céu, não participa do fruto do sangue do Filho de Deus”(3).

Com enorme vigor, dirigiu prementes exortações a cardeais, bispos e sacerdotes, implorando-lhes a reforma da Igreja e a pureza dos costumes. E não deixou de censurá-los gravemente, embora sempre com humildade e respeito pela dignidade de que estavam revestidos, pois “são ministros do sangue de Cristo”(4(. Estava convencida de que da conversão e do exemplo dos pastores da Igreja dependia a saúde espiritual do rebanho.

Pedimos hoje a Santa Catarina de Sena que saibamos alegrar-nos com as alegrias da nossa Mãe a Igreja e sofrer com as suas dores. E nos perguntamos como é a nossa oração pelos pastores que a governam, se oferecemos diariamente algum sacrifício, horas de trabalho, contrariedades suportadas com serenidade... pelas intenções do Santo Padre, desejosos de ajudá-lo a enfrentar essa imensa carga que Deus colocou sobre os seus ombros. Pedimos também a Santa Catarina que nunca faltem bons colaboradores ao lado do “doce Cristo na terra”.

“Para tantos momentos da história, que o diabo se encarrega de repetir, parece-me uma consideração muito acertada aquela que me escrevias sobre lealdade: «Trago o dia todo, no coração, na cabeça e nos lábios, uma jaculatória: Roma!»”(5) Esta única palavra é suficiente para nos ajudar a manter a presença de Deus durante o dia e a manifestar a nossa unidade com o Romano Pontífice e a nossa oração por ele.

II. SANTA CATARINA revelou sempre uma requintada sensibilidade, foi profundamente feminina(6). Ao mesmo tempo, foi extraordinariamente enérgica – como são as mulheres que amam o sacrifício e permanecem junto da Cruz de Cristo –, e não permitia desfalecimentos e fraquezas no serviço de Deus. Estava convencida de que, tratando-se da salvação própria e da salvação das almas, resgatadas por Cristo com o seu Sangue, não tinha cabimento algum enveredar por caminhos de excessiva indulgência, adoptar por comodismo ou covardia atitudes de débil filantropia, e por isso gritava: “Basta de unguentos! Pois com tanto ungüento estão-se apodrecendo os membros da Esposa de Cristo!”

Foi sempre fundamentalmente optimista, e não desanimava se, depois de ter feito o que estava ao seu alcance, os assuntos não se resolviam à medida dos seus desejos. Durante toda a sua vida, foi uma mulher profundamente delicada. Os seus discípulos recordaram sempre o seu sorriso aberto e o seu olhar franco; andava sempre bem arrumada, amava as flores e costumava cantar enquanto caminhava. Quando um personagem da época, incitado por um amigo, a procurou para conhecê-la, esperava encontrar uma pessoa de olhar oblíquo e sorriso ambíguo. Teve a grande surpresa de encontrar uma mulher jovem, de olhar claro e sorriso cordial, que o acolheu “como a um irmão que voltava de uma longa viagem”.

Pouco tempo depois de ter retornado a Roma, o Papa morreu. E com a eleição do sucessor iniciou-se o cisma que tantos rasgões e tantas dores havia de produzir na Igreja. Santa Catarina falou e escreveu a cardeais e reis, a príncipes e bispos... Tudo em vão. Exausta e cheia de pena, ofereceu-se a Deus como vítima pela Igreja. Num dia do mês de Janeiro, quando rezava diante do túmulo de São Pedro, sentiu sobre os seus ombros o imenso peso da Igreja, como aconteceu com outros santos. Mas o tormento durou poucos meses: no dia 29 de abril, por volta do meio-dia, Deus a chamou para a sua glória.

Do leito de morte, dirigiu ao Senhor esta comovente oração: “Ó Deus eterno!, recebe o sacrifício da minha vida em benefício deste Corpo Místico da Santa Igreja. Não tenho outra coisa para oferecer-te a não ser aquilo que me deste”(7). Uns dias antes, tinha dito ao seu confessor: “Asseguro-lhe que, se morrer, a única causa da minha morte será o zelo e o amor à Igreja que me abrasa e me consome...”

Os nossos dias são também de provas e dor para o Corpo Místico de Cristo. Por isso, “temos de pedir ao Senhor, com um clamor que não cesse (cfr. Is LVIII, 1), que os abrevie, que olhe com misericórdia para a sua Igreja e conceda novamente a luz sobrenatural às almas dos pastores e às de todos os fiéis”(8). Ofereçamos a nossa vida diária, com as suas mil pequenas incidências, pelo Corpo Místico de Cristo. O Senhor haverá de abençoar-nos e Santa Maria – Mater Ecclesiae – derramará a sua graça sobre nós com particular generosidade.

III. SANTA CATARINA ensina-nos a falar com clareza e valentia quando se debatem assuntos que afectam a Igreja, o Sumo Pontífice ou as almas. Não serão poucos os casos em que teremos a grave obrigação de esclarecer a verdade, e, nessas ocasiões, poderemos aprender de Santa Catarina, que nunca retrocedeu diante do fundamental, porque tinha a sua confiança posta em Deus.

Diz-nos o Apóstolo S. João: "Eis a mensagem que ouvimos de Jesus e vos anunciamos: Deus é luz e nele não há nenhuma espécie de trevas"(9). Aqui estava a origem da força dos primeiros cristãos, bem como da dos santos de todos os tempos: não ensinavam uma verdade própria, mas a mensagem de Cristo que nos foi transmitida de geração em geração. É o vigor de uma Verdade que está por cima das modas, da mentalidade de uma época concreta. Devemos aprender cada vez mais a falar das coisas de Deus com naturalidade e simplicidade, mas ao mesmo tempo com a segurança que Cristo pôs na nossa alma.

Perante a campanha sistematicamente organizada para obscurecer a verdade ou silenciar tudo o que sejam obras boas e retas, que às vezes quase não têm eco nos grandes meios de comunicação, nós, cada um no seu ambiente, temos de atuar como porta-vozes da verdade. Alguns Papas falaram da conspiração do silêncio(10), que se tece em torno das boas obras – literárias, cinematográficas, religiosas, de benemerência social – promovidas por bons católicos ou por instituições organizadas por católicos. São silenciadas ou deixadas na penumbra pelo facto de serem promovidas por católicos, enquanto se orquestram louvores a obras ou iniciativas que atentam contra os valores humanos, que pregam uma falsa liberdade e a anti-solidariedade, ou que cancelam do horizonte do homem as ânsias de Deus.

Nós podemos fazer muito bem neste apostolado da opinião pública. Às vezes, não conseguiremos esclarecer senão os vizinhos, os amigos que visitamos ou nos visitam, os colegas de trabalho... Noutros casos, poderemos ir um pouco mais longe por meio de uma carta aos jornais, de uma chamada telefónica a uma emissora de rádio ou de televisão, não nos furtando a responder ao questionário de uma pesquisa de opinião pública... Devemos afastar a tentação do desalento, o sentimento de que “pouco podemos fazer”. Um rio caudaloso é alimentado por pequenos regatos que, por sua vez, se formaram talvez gota a gota. Que não falte a nossa. Assim começaram os primeiros cristãos.

Peçamos hoje a Santa Catarina que nos comunique um pouco do seu amor à Igreja e ao Sumo Pontífice, e que tenhamos ânsias de dar a conhecer a doutrina de Cristo em todos os ambientes, por todos os meios ao nosso alcance, com imaginação e com amor, com sentido optimista e positivo, sem negligenciar uma única oportunidade. E, com palavras da Santa, peçamos também a Nossa Senhora: “A ti recorro, Maria! Ofereço-te a minha súplica pela doce Esposa de Cristo e pelo seu Vigário na terra, a fim de que lhe seja concedida luz para governar a Santa Igreja com discernimento e prudência”(11).

(1) João Paulo II, Homilia em Sena, 14-X-1980; (2) Santa Catarina de Sena, Cartas, III; (3) idem, Carta 207, III; (4) cfr. Paulo VI, Homilia na proclamação de Santa Catarina de Sena como Doutora da Igreja, 4-X-1970; (5) Josemaría Escrivá, Sulco, n. 344; (6) cfr. João Paulo II,Homilia, 29-IV-1980; (7) Santa Catarina de Sena, Carta 371, V; (8) Josemaría Escrivá, Amar a Igreja, Prumo-Rei dos Livros, Lisboa, 1990, pág. 59; (9) 1 Jo 1, 5; (10) cfr. Pio XI, Enc. Divini Redemptoris, 10-III-1937; (11) Santa Catarina de Sena, Oração, XI.

Pe. Francisco Fernández Carvajal in hablarcondios.org



blogger

Sem comentários: