sexta-feira, 31 de julho de 2020

O 'Gato de Cheshire' e a decadência do Cristianismo liberal


O projecto para destruir o Cristianismo está em curso há mais de três séculos, mas foi só nos últimos 50 anos que os anticristãos descobriram a sua arma mais eficiente.

Este projecto teve o seu início cerca do ano 1700 com o aparecimento do deísmo como alternativa ao Cristianismo. Surgiram umas quantas variedades de deístas. Alguns (por exemplo Voltaire e Tom Paine) detestavam o Cristianismo. Outros (como Jefferson e Kant), não odiavam o Cristianismo, simplesmente consideravam-no um sistema de crenças inferior, um sistema que contém alguns belos princípios morais, mas também algumas superstições perniciosas. Voltaire tentou destruir o Cristianismo (apelando à eliminação “da coisa infame” – Ecraszez l’infame) fazendo troça dele, como no seu Dicionário Filosófico. 

E como era um homem com grande sentido de humor, até teve um certo sucesso. Jefferson tentou destruir o Cristianismo mostrando o quão porreiro Jesus era, desde que a sua imagem pudesse ser libertada das muitas superstições adicionais que os cristãos tinham afixado nele, como quem coloca decorações numa árvore de Natal. Vejam, nesse sentido, “A Vida e Moral de Jesus de Nazaré” que é, literalmente, uma edição de corta e cola do Novo Testamento.

Este tipo de ataque levou algumas pessoas a abandonar o Cristianismo, mas não muitas. Para ser afectado por críticas destas era preciso ler livros, e lê-los com alguma atenção. Por outras palavras, era preciso ser intelectual ou semi-intelectual.

Na segunda meta do século XIX surgiu outro grande ataque ao Cristianismo. Desta vez os anticristãos usaram a teoria de Darwin da evolução das espécies, a filosofia do agnosticismo de Spencer e a história crítica alemã da Bíblia para bater na velha religião. Mais uma vez, tratou-se de um ataque bastante intelectual, que apelava a pessoas que liam livros e artigos de revistas sérias. Contudo, devido ao grande crescimento da prosperidade económica durante o século XIX, o mundo tinha muito mais intelectuais e semi-intelectuais do que no século anterior. Por isso este ataque produziu muito mais deserções do Cristianismo. Não obstante, o Cristianismo continuaria, de longe, a ser o sistema de crenças dominante do mundo ocidental.

Um dos efeitos secundários deste ataque da era vitoriana foi o protestantismo liberal, que acreditava estar a adaptar o Cristianismo para o tornar mais apetecível ao homem moderno, mas que acabou por conduzir, nos primeiros sessenta e tal anos do século XX, a um grande número de deserções, algumas inconscientes, do protestantismo clássico. Um protestante liberal podia abandonar um após outro os artigos do Credo tradicional, tal como o nascimento virginal, a divindade de Cristo, a expiação e a Ressurreição, enquanto se continuava a apelidar de cristão e acreditar, mais ou menos honestamente, que o era. (Outro efeito secundário foi o Modernismo Católico, porém esse foi morto à nascença por Pio X).

Mas o maior golpe contra o Cristianismo, o golpe que parece ter sido em grande medida bem-sucedido no objectivo de reduzir o Cristianismo a um estatuto minoritário no mundo ocidental, foi a revolução sexual, que começou na década de 60. Não era preciso ser um intelectual ou um semi-intelectual para se participar na revolução sexual. Não era preciso ler livros ou artigos de revistas nem participar em conferências chiques.

Bastava cometer aquilo que o mundo cristão até então tinha chamado um pecado sexual e ao mesmo tempo sentir que o que tinha feito, longe de ser um pecado, era de facto um gesto bom. Nem sequer era preciso cometer este pecado pessoalmente, bastava dar a sua aprovação ao pecado em geral. A revolução foi só em parte uma alteração em grande escala do comportamento sexual. Em maior medida constituiu uma mudança na avaliação moral do comportamento sexual, transformando os sinais negativos em positivos.

Claro que o protestantismo liberal (a que se juntou, depois do Vaticano II, o Catolicismo neomodernista que tinha recuperado do golpe aparentemente mortal que lhe tinha sido infligido no início do século XX por Pio X) fez aquilo que faz melhor e disse que se podia ser um cristão mesmo enquanto se repudiava a moral sexual que remonta aos primórdios do Cristianismo. Num acto incrível de auto-ilusão, muitos protestantes e católicos conseguiram mesmo convencer-se de que isso é verdade. Mas este tipo de ilusão tem pouco poder de permanência. É tão claramente ridículo que não é o género de coisa que possamos passar a gerações futuras.

Vivemos numa era em que o Cristianismo, tal como o Gato de Cheshire – de Alice no País das Maravilhas – está gradualmente a apagar-se na maior parte dos países mais desenvolvidos do mundo. O Gato de Cheshire deixou apenas o seu sorriso. O Cristianismo liberal, seja protestante ou católico, também está a deixar para trás o que parece ser um sorriso, um sorriso que diz, “sou um grande fã de Jesus, o tipo porreiro cuja mensagem intemporal se resume às magníficas palavras, ‘não julgues para que não sejas julgado’”.

David Carlin in thecatholicthing.org (traduzido por 'Actualidade Religiosa')


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7 comentários:

Maria José Martins disse...

Bela análise, sem dúvida!
E o remate final encheu-me as medidas, não estejamos todos "cansados" dessa justificativa, para podermos passar ao lado, sem grandes "chatices", de toda a incoerência que, infelizmente, constatamos, nesse "novo cristianismo", até na Igreja!
Realmente, Jesus ensina-nos a que não devemos julgar, mas também nos diz que "pelos frutos se conhece a árvore."
Ora, "como contra factos não há argumentos", depressa podemos concluir que se as acções forem perversas é porque, infelizmente, não estão ligadas à VIDEIRA!

Eduardo disse...

Então a maçonaria não entra neste filme? Qualquer análise do ataque ao catolicismo que não a mencione é muito superficial

Maria José Martins disse...

Eduardo, a ironia posta na última parte do Artigo versa precisamente o conceito "porreiro", do actual Cristianismo, defendido pela maçonaria eclesiástica, segundo o que já li.
Um Cristianismo sem Cruz, relativista, onde cada um interpreta a Palavra de Deus-- que é IMUTÁVEL, porque PERFEITA-- como lhe apetece e interessa.

Anónimo disse...

"Tanto a perseguição aos Jesuítas como a revolução francesa foram obras da maçonaria."

(Dom Vital)

Eduardo disse...

" O Papa, seja ele qual for, nunca fará parte das sociedades secretas. Cabe a estas a iniciativa de irem para a Igreja, com o objectivo de conquistarem ambos. O trabalho que começamos não é trabalho de um dia, nem de um mês, nem de um ano. Pode durar muitos anos, talvez um século, mas nas nossas fileiras o soldado morre mas a luta continua" - Instrução Permanente da Alta Vendita (loja superior dos carbonários na Itália)

Anónimo disse...

O declínio do cristianismo começou com a queda dos templários, teve o seu apogeu precisamente na idade média. Foi um ciclo dentro da idade actual Kali Yuga, do meu ponto de vista. O desenvolvimento tecnológico é o maior sintoma da queda de religiosidade que começou com o protestantismo. Um bom livro para se perceber o que está a acontecer é o "Reino da Quantidade e os Sinais dos Tempos" do René Guénon.

Eduardo disse...

Diz Ploncard d'Assac que a maçonaria é filha dos templários e que a origem da corrupção destes está na Kabala.