segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

São Raimundo de Penhaforte, padroeiro dos Canonistas

Grande canonista e moralista
  
Pregou a cruzada contra os mouros e compôs uma Suma de casos de consciência, que exerceu sobre o Direito Canónico e a moral influência durável através dos séculos.

Raimundo nasceu por volta de 1176 no castelo de Penhaforte, próximo de Villafranca del Panadés, na Catalunha, Espanha. O seus pais, ricos e nobres, descendiam dos antigos condes de Barcelona. Eram também aparentados com a casa real de Aragão.

Fez os seus estudos na escola da catedral de Barcelona e formou-se depois em letras, com tal êxito que o Bispo o convidou para nela lecionar retórica e lógica. Tinha então 20 anos. Desapegado de qualquer interesse humano, ensinava gratuitamente, dando a todos o exemplo com as suas virtudes.

Em 1210 foi estudar Direito civil e eclesiástico na famosa universidade de Bolonha, na Itália. Fez a viagem a pé, pedindo esmolas pelo caminho.

Ao passar por Briançon, em França, presenciou um estupendo milagre operado por Nossa Senhora de Delbeza. Um jovem fora assaltado por ladrões, que lhe furaram os olhos e cortaram as mãos. A Virgem restituiu-lhe mãos e olhos. O relato autêntico desse facto passou para a História narrado pelo próprio São Raimundo.

Doutor em Direito canónico e civil

Estudando com diligência, auxiliado por boa inteligência e feliz memória, doutorou-se com brilho em 1216. Foi então escolhido, por aclamação, para ensinar na própria universidade, onde os alunos eram sobretudo nobres e letrados. Ensinou com êxito durante dois anos, não exigindo nenhuma remuneração. Entretanto, o senado da cidade concedeu-lhe um soldo anual, que utilizava para auxiliar os párocos pobres e os necessitados em geral.

Um novo acontecimento veio mudar totalmente o rumo da sua vida. Em 1218 o Bispo de Barcelona, Berenguer de Palou, no desejo de obter para a sua diocese alguns frades da nova ordem dos dominicanos, foi à Itália para encontrar-se com São Domingos de Gusmão. Passando por Bolonha, ouviu os maiores elogios a Raimundo, e quis tê-lo como professor do seminário que ia fundar. Depois de muita insistência — alguns autores dizem mesmo que o Papa interveio no assunto — ele aceitou.

Em Barcelona recebeu um canonicato e foi elevado à dignidade de arcediago da catedral. Cheio de zelo pela casa de Deus, aproveitava todas as ocasiões para aumentar o decoro da Catedral e a majestade do culto divino. As novas e maiores rendas permitiram-lhe também socorrer com mais liberalidade os pobres, a quem chamava “meus credores”.

Muito devoto do mistério da Anunciação, obteve do Bispo e do capítulo da Catedral que passassem a festejar com maior solenidade essa festa. Deixou para isso parte deasua renda.

Desejoso de levar vida mais recolhida e penitente, pediu admissão nos dominicanos em 1222, apenas oito meses depois de São Domingos falecer. Ia completar 47 anos de idade, mas começou o noviciado com o fervor do mais jovem postulante.

Co-fundador da Ordem de Na. Sra. das Mercês

São Raimundo pediu ao seu superior que lhe impusesse severa penitência, a fim de expiar a vã complacência que supunha haver tido quando catedrático em Bolonha. Tendo em vista a grande capacidade e conhecimento que o noviço possuía do Direito e dos cânones, o superior mandou-o escrever uma Suma de casos de consciência para que, por ela, se orientassem os confessores da Ordem. O Papa Clemente VIII afirmou que esse trabalho de São Raimundo era “tão útil aos penitentes quanto necessário aos confessores”. Foi o primeiro escrito do gónero, tendo alcançado grande difusão.

Segundo a tradição, nessa época Nossa Senhora apareceu em sonhos, na mesma noite, a São Raimundo, ao seu dirigido São Pedro Nolasco, e ao Rei Jaime I, inspirando-lhes o desejo de fundar uma ordem religiosa e militar cujos membros se obrigassem, por voto, a redimir os cativos em poder dos mouros. Assim surgiu, no dia 10 de agosto de 1223, a Ordem de Nossa Senhora das Mercês para a Redenção dos Cativos. São Raimundo redigiu o corpo de prescrições e regras para a nova Ordem, inspiradas na regra dos dominicanos. Mais tarde, em fevereiro de 1235, foi ele também quem obteve do Papa Gregório IX a aprovação definitiva da Ordem.

Pregador de cruzada, confessor do Papa, inquisidor
 
Em 1229 o Cardeal João Helgrin d’Abbeville, legado da Santa Sé em Espanha, foi encarregado de uma tríplice missão: pregar a cruzada contra os mouros; declarar nulo o casamento de Jaime de Aragão com Eleonora de Castela; e fazer a visita canónica das igrejas, pondo em vigor, onde necessário, os decretos do Concílio de Latrão. O Cardeal associou a si São Raimundo de Penhaforte, que percorreu as cidades da região a fim de preparar o povo para receber o legado. Pregava a indulgência da cruzada, ouvia confissões e dispunha com prudência os corações, de maneira que, chegando o legado, encontrasse já os ânimos muito bem dispostos para as novas medidas.

Finda a missão, o Cardeal d’Abbeville, ao dar ao Papa conta de sua missão, ressaltou a preciosa ajuda de São Raimundo, a quem cobriu de elogios. Gregório IX encarregou então o santo de pregar nas províncias de Arles e Narbona em favor da expedição do rei Jaime de Aragão contra os mouros.

No ano seguinte o Papa chamou-o à corte pontifícia, escolhendo-o para seu confessor, capelão e penitenciário. Nessa qualidade o santo redigiu grande número de documentos para o Soberano Pontífice. Como confessor, impunha ao Papa, como penitência, despachar com misericórdia e brevidade as causas dos pobres que acudiam à corte pontifícia e não tinham protector.

Tomou ainda parte activa na introdução da Inquisição em Aragão e deu o seu parecer sobre o procedimento a seguir em relação aos hereges da província de Tarragona. Vagando a sé dessa cidade, Gregório IX nomeou-o seu Bispo. São Raimundo protestou tanto e chegou a adoecer tão gravemente, que o Papa revogou a nomeação, pelo temor de perdê-lo.

Ordena a coleção das Decretales

O trabalho intelectual mais importante que se deve a São Raimundo de Penhaforte na corte pontifícia foi o de ordenar e editar a nova coleção das Decretales (os vários decretos e decisões pontifícias regulando pontos da disciplina eclesiástica e civil), destinada a substituir as várias existentes, que estavam em profunda desordem e confusão. O santo trabalhou durante quatro anos nessa tarefa. Gregório IX, mediante bula de 5 de Setembro de 1234, enviou a nova coleção às universidades de Paris e Bolonha, em caráter oficial.

Em 1237, Gregório IX encarregou-o de absolver o rei Jaime de Aragão da excomunhão em que havia incorrido, devido ao atentado cometido, através dos seus agentes, contra o Bispo eleito de Saragoça. O santo exerceu as funções de penitenciário até 1237 ou começo de 1238. Tendo então adoecido gravemente, os médicos aconselharam-lhe os ares da pátria.  

No capítulo geral dos dominicanos realizado em Bolonha, apesar de ausente, foi eleito por unanimidade para substituir o geral Jordão de Saxe, falecido num naufrágio.

Tendo que aceitar o cargo por obediência, promoveu uma nova redação das constituições da Ordem, que foram aprovadas em 1239 no capítulo geral de Paris.

Em 1240 demitiu-se do generalato devido à idade e pouca saúde, e voltou para o seu convento de Barcelona. Mas lá não permaneceu inativo. Promoveu uma campanha de apostolado em relação aos judeus e mouros da Espanha e da África, e trabalhou com sucesso para a repressão da heresia na Espanha.

Foi também por iniciativa sua que se abriu em Múrcia uma escola de hebreu, para facilitar o ministério apostólico com os judeus.

A tradição conservou um milagre ocorrido com São Raimundo nessa época. O Rei Jaime I – que tinha o santo em grande consideração, e frequentemente recorria ao seu ministério e conselhos – levou-o consigo numa viagem à ilha de Mallorca. Levou também ocultamente uma mulher com quem mantinha relações ilícitas. Ao descobrir isso, pediu ao Rei que despedisse a mulher, caso contrário ele se retiraria. O soberano prometeu atendê-lo, mas não cumpriu a promessa. Para impedir o santo de deixar a ilha, ordenou a todos os portos que não o aceitassem a bordo. São Raimundo estendeu então o seu manto sobre as águas, e nesse barco improvisado atravessou o braço do Mediterrâneo até Barcelona.

São Raimundo de Penhaforte morreu no dia 6 de Janeiro de 1275, já nonagenário, sendo canonizado em 1601.

Plinio Maria Solimeo in catolicismo.com.br

Obras consultadas:

A. Teetaert, Raymond de Penyafort, in Dictionnaire de Théologie Catholique, Letouzey et Ané, Éditeurs, Paris, 1903, Tomo XIII, cols. 1806 e ss.

Les Petits Bollandistes, Saint Raymond de Pennafort, in Vies des Saints, Bloud et Barral, Libraires-Éditeurs, Paris, 1882, tomo I, pp. 576 e ss.

Edelvives, San Raimundo de Peñafort, in El Santo de Cada Dia, Editorial Luis Vives, S.A., Saragoça, 1946, tomo I, pp. 231 e ss.

Fr. Justo Perez de Urbel, O.S.B., San Pedro Nolasco y San Raimundo de Peñafort, in Año Cristiano, Ediciones Fax, Madri, 1945, tomo I, pp. 197 e ss.


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2 comentários:

Maria José Martins disse...

Com tantos Testemunhos, onde se pode constatar a Fidelidade do nosso Deus às Suas Promessas, como temos ainda TANTO MEDO de ARRISCAR POR ELE?!
Depois de ler a vida destes Santos, e as Coisas Extraordinárias que Deus fez por eles, nos momentos mais difíceis-- mas depois de Tudo Lhe entregarem--penso naquilo que Deus faria por nós, neste momento, se pelo menos, LHE MOSTRÁSSEMOS UM POUQUINHO Da nossa CONFIANÇA!...

Maria José Martins disse...


E para reforçar o que em cima escrevi, vou, mais uma vez, transcrever as palavras de Jesus sobre os milagres, na Obra: "O Evangelho como me foi revelado" de Maria Valtorta.
Diz-nos Jesus: "Mas quando Eu não estiver mais entre vós, vós fareis o que Eu fiz e ainda mais. Mas, não somente, pelo dom do poder dos milagres, mas, sobretudo, pela vossa Santidade, é que sereis queridos no Meu Coração, e o Espírito de Deus vos Iluminará, enquanto a Sua Bondade e o Seu Poder encherão as vossas mãos, com os dons de Cristo!
O milagre não é um ato comum e indispensável. Felizes daqueles que souberem permanecer na Fé, sem meios extraordinários, que os ajudem a Crer, mas também não são reservados para "tempos especiais", que possam cessar, quando esses tempos acabarem. O MILAGRE SEMPRE EXISTIRÁ NO MUNDO, e quantos mais Justos houver, mais milagres existirão!
E, quando forem feitos MUITO RARAMENTE, pode-se afirmar, que a FÉ e a JUSTIÇA estão ENFRAQUECIDAS!
Eu disse: "Os Sinais, que acompanharão aqueles que têm uma verdadeira Fé em Mim, serão a vitória sobre os DEMÔNIOS e sobre as DOENÇAS, sobre os ELEMENTOS e sobre as EMBOSCADAS.
Deus Ama quem O Ama, e o Sinal de que os Meus fiéis estarão em Mim será o NÚMERO e a FORÇA dos prodígios, que farão em Meu Nome e para a Glória de Deus.
A um mundo sem milagres VERDADEIROS podemos dizer, sem caluniar: PERDESTE a FÉ e a JUSTIÇA. Tu és um mundo sem SANTOS! (...)"

Reforço esta Passagem de Jesus, porque já ouvi de alguém muito responsável, que os Milagres somente foram concebidos para os Apóstolos e pouco mais...ao que retorqui: Então, como se explica que os Santos os consigam, mesmo durante a vida?
Para quem se interroga como eu, acho estar naquele excerto a resposta.
Só é pena, que ainda haja quem persiga e critique, algumas "almas-- ou Santos-- de Eleição", que, pela sua Fidelidade, obtêm de Deus esse dom, sobretudo, para os outros, porque, normalmente, eles sofrem ataques de toda a ordem!--refiro-me, somente, a pessoas com fama de Santidade--
E, perante isto, e refletindo nas palavras de Jesus, é caso para perguntar: "MAS EM QUE MUNDO NOS ENCONTRAMOS?!"