Já é a terceira vez em poucos anos. Nos momentos menos
inspirados da galhofa política, o Governo francês entretém-se a brincar com o
Vaticano.
Nicolas Sarkozy escolheu para embaixador no Vaticano um
divorciado, recasado. Fartou-se de insistir, até se convencer de que o Papa nunca
o aceitaria. Escolheu em alternativa um homem que vivia com o seu marido (devo
pôr aspas?). Fartou-se outra vez de esperar… Até que, finalmente, compreendeu
que era melhor seguir uma estratégia diferente.
Agora, o Governo de François Hollande volta ao jogo, nomeando
um homossexual para embaixador junto do Papa. Os jornais franceses noticiaram
que o núncio em Paris teve uma conversa pessoal com o indigitado, pedindo-lhe
para desistir. Passaram 4 longos meses e o impasse já é escândalo nos jornais
de todo o mundo. Inclusivamente, alguns jornalistas asseguram que o próprio
Papa Francisco recebeu o nomeado, num encontro muito discreto, para lhe fazer ver
a situação. Perante as críticas, o Governo francês louva o currículo do
indigitado e informa que ele é muito recatado acerca das suas tendências. O
facto é que o Papa terá diligenciado aquele contacto reservado com ele, mas não
recebe as suas cartas credenciais.
Não se sabe quanto tempo é que o Governo francês precisa
para resolver o impasse, nem sabemos em que medida aprendeu alguma coisa. Com três
episódios em poucos anos, tem material abundante para estudo e revisão de
matéria.
O Papa Francisco tem sido muito claro a explicar a diferença
entre «pecadores e corruptos», entre aquele mal que devemos ajudar a superar e aquele
outro que, mantendo o respeito por todos, não podemos aceitar.
Fraquezas, todos temos. Por isso, em vez de nos acusarmos
mutuamente, devemos apoiar-nos. Às vezes, a amizade pode consistir em elogiar,
outras vezes requer a coragem de dizer uma verdade incómoda. Em qualquer caso,
os outros têm direito a ser estimados, com as suas qualidades e os seus
defeitos. Deus não nos pede para os julgar, mas para os amar e, se for preciso,
para perdoar. Deus e os outros têm muito que nos perdoar… oxalá não nos falte a
humildade de o reconhecer.
Ser corruptos, como diz o Papa Francisco, é outra coisa. É
organizar-se para fazer o mal, gostar de estar errados e trabalhar para isso.
Um ladrão pode ser um pecador que sucumbe ao vício, mas gostaria de não ser fraco.
Um explorador da injustiça, com regulamentos em dia e contabilidade organizada,
está mais próximo da figura do corrupto. Analogamente, um marido infiel ou um
sujeito violento podem ser aquele tipo de pecadores que o Papa não quer julgar,
mas compreender e ajudar. O dono de uma clínica de aborto, ou um vendedor de
armas ou de drogas, correspondem provavelmente ao conceito de corrupto, que o
Papa classifica como uma degradação mais terrível.
Jesus também fazia esta distinção. Chegou a dizer que as
prostitutas iam chegar primeiro ao Céu (Mt 21, 31) e há casos desses, bem
documentados no Evangelho.
Por outro lado, não poupou uns certos justos, aparentemente
certinhos, mas contentes com o mal. «Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas!
Pagais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho e desprezais os preceitos
mais importantes da lei: a justiça, a misericórdia, a fidelidade» (Mt 23, 23).
O nosso Papa Francisco tem sido exemplar a abrir-nos os olhos
e o coração para acolher todos os que precisam de apoio. Instituiu mesmo um Ano
de Misericórdia, para nos reconciliarmos uns com os outros e sobretudo com
Deus, em particular por meio do Sacramento da Confissão. Ao mesmo tempo, é
firme. Não admite ligeirezas a brincar com o mal. Todos recordam aquele «quem
sou eu para julgar?» e a continuação dessa frase: «O problema não é ter essa "orientação" [homossexual]. Devemos ser irmãos. O problema é fazer lóbi por essa
orientação, ou lóbis de avarentos, lóbis políticos, lóbis maçons, tantos lóbis.
Esse é o pior problema». De vez em quando, o Papa recorda o Inferno e a
realidade do Demónio, para percebermos aonde vai parar a reinação.
José Maria C.S. André in «Correio dos
Açores»,
26-IV-2015
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