quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Dia de São Gabriel de Nossa Senhora das Dores

Gabriel de Nossa Senhora das Dores, a quem Leão XIII chamava o “São Luiz Gonzaga dos nossos dias”, nasceu em Assis (Itália), a 1 de Março de 1838, filho de Sante Possenti de Terni e Inês Frisciotti. No mesmo dia em que viu a luz do mundo, recebeu a graça do Baptismo, na mesma pia em que foi baptizado o grande Patriarca S. Francisco, na igreja de São Rufino.

O pai, já aos vinte e dois anos, era Governador da cidade de Urbânia, cargo que sucessivamente veio a ocupar em S. Ginésio, Corinaldo, Cingoli e Assis. Como um dos magistrados dos Estados Pontifícios, gozava de grande estima por parte de Papa Pio IX, e Leão XIII honrava-o com a sua sincera amizade. A mãe era de uma nobre família de Civitanova d’Ancona. Estes dois cônjuges eram modelos de esposos cristãos, vivendo no santo temor de Deus, unidos no vínculo de respeito e amor fidelíssimo, que só a morte era capaz de solver. Deus abençoou esta santa união com treze filhos, dos quais Gabriel era o undécimo. Este, no Baptismo recebeu nome de Francisco, em homenagem ao seu avô e ao Seráfico de Assis.

Dando testemunho da educação que recebiam na família, no Processo da beatificação do Servo de Deus, os seus irmãos declararam: “Nós fomos educados com o máximo cuidado no que diz respeito à piedade e à instrução. A nossa mãe era piedosíssima e educou-nos segundo as máximas da nossa santa Religião”.

Nos braços, sobre os joelhos de uma mãe profundamente religiosa, o pequeno Francisco aprendeu os rudimentos da vida cristã e a pronunciar os santos nomes de Jesus Maria.

A grande felicidade que na infância reinava experimentou um grande abalo quando, inesperadamente, o Anjo da Morte veio visitar aquele lar e arrebatar-lhes a mãe. D. Inês, sentindo que se aproximava a última, na compreensão do seu dever de mãe cristã, reuniu todos os filhos à cabeceira do leito mortal, estreitou-os, um por um, ao seu coração, selou a sua fronte com o último beijo, deu-lhes a bênção, distinguindo com mais carinho os de tenra idade, entre estes, Francisco; munida de todos os Sacramentos, confortada pela graça de Deus, aos 38 anos de idade deixou este mundo, para, na Eternidade, perto de Deus, receber o prémio das suas raras virtudes.

Do pai, o próprio Francisco deu o seguinte testemunho ao seu director espiritual:  

“Meu pai”, declarou, “tinha por costume levantar-se bem cedo. Dedicava uma hora à oração e meditação; se neste tempo alguém desejava falar-lhe, havia de esperar pelo fim das práticas religiosas. Terminadas estas, ia à igreja assistir a Santa Missa e costumava levar consigo dos filhos os que não fossem impedidos. Finda a Santa Missa metia-se ao trabalho. À noite, reunia os seus filhos e dava-lhes sábios conselhos e úteis exortações. Falava-lhes dos deveres para com Deus, do respeito devido à autoridade paternal e do perigo das más companhias”. “Os maus companheiros”, dizia ele, “são os assassinos da juventude, os satélites de Lúcifer, traidores escondidos e, por isso, era para temê-los e deles ter cuidado”.

Os biógrafos de Francisco fazem ressaltar, em primeiro lugar, a extraordinária bondade de coração do menino, principalmente para com os pobres. Muitas vezes ficou ele sem a merenda, por tê-la dado aos pobres. Entre os seus irmãos, era ele o anjo da paz, sempre pronto para desculpar e para defendê-los, quando acusados injustamente. Não suportava a injúria, fosse ela atirada a si ou a um dos seus. Com a maior facilidade, se desfazia de objectos de certo valor, com que tinha sido homenageado. Assim, presenteou a um de seus irmãos uma bela corrente de prata que tinha recebido de um parente. Estes bons traços no caráter de Francisco não afastam certas sombras que nele subsistiam também. Os que o conheciam meigo, bondoso, compassivo, sabiam-no também ser nervoso, impaciente, irascível.

Por felicidade sua, o senhor Sante, seu pai, não era daqueles que desculpam os caprichos dos seus filhos, sob o pretexto de “serem crianças”, sem pensar que mais tarde terão de pagar bem caro esta condescendência e fraqueza. O verdadeiro amor cristão fê-lo combater sem tréguas todos os defeitos. Francisco era obediente e tinha grande respeito ao pai, o que, aliás, não impedia que diante de uma severa repreensão desse largas ao seu génio impulsivo, com palavras e gestos demonstrando o seu descontentamento, a sua raiva. Mas tudo isto era fogo fátuo. Logo, voltava às boas; a sua boa índole não permitia que estas revoltas interiores durassem muito tempo. Era encantador ver, momentos depois, o menino desfeito em pranto, procurar o pai e, por seus modos ingénuos e infantis, assegurar-se do perdão e do amor do Sr. Sante. Este, fingindo não dar crédito a estas demonstrações, retrucava bruscamente: “Nada de carícias; quero ver factos”. Então, o menino atirava-se ao colo do pai, beijava-o e sentia-se feliz, em ter voltado à paz, com o perdão paterno. Nesta escola de sábia pedagogia, Francisco cedo aprendeu combater e vencer os seus defeitos.

Durante algum tempo, Francisco ficou entregue aos cuidados de um mestre; depois frequentou o colégio dos “Irmãos das Escolas Cristãs”, onde fez rápidos progressos, figurando sempre entre os melhores alunos. Com sete anos fez a sua primeira confissão. Um ano depois, em Junho de 1846, recebeu o sacramento da confirmação. Tudo isto prova que o menino já se achava bem instruído nas Verdades da nossa Fé, graças ao sólido ensino que lhe dispensavam os beneméritos “Irmãos Sallistas”.

Nesse mesmo tempo, caiu também a data da sua primeira comunhão, para a qual se preparou com todo o esmero. Testemunha de vista desse grandioso acto diz:  

“O fervor com que o vi chegar-se da sagrada mesa, o espírito de fé que se estampava no seu semblante, o vigor dos seus afectos foram tais que se chegava a crer ser ele levado por um Serafim”.  
 
Esses sentimentos de fé e de piedade, aquelas chamas de amor ao SS. Sacramento não mais se separaram do coração de Francisco nos anos de sua mocidade, nem no meio de uma vida dissipada, de certo modo mundana. Não menos certo é que a frequente recepção da santa comunhão preservou-o de graves desvios no meio das tentações do mundo.

Terminados os estudos elementares, o pai pensou em procurar para Francisco uma educação mais elevada, de acordo com a sua posição social, e confiou o seu filho aos “Padres Jesuítas” que, na cidade de Spoleto, dirigiram um colégio. Neste educandário, passou Francisco os anos todos de sua mocidade no mundo e chegou a cursar os quatro semestres de estudos filosóficos. Estudante inteligente e cumpridor exacto do seu dever, deixou boa memória naquele colégio e formavam-se as mais belas esperanças a seu respeito. Ano não passava que não ganhasse um prémio; e no fim dos seus estudos foi distinguido com uma medalha de ouro. Mestres e colegas também o estimavam. 

Tudo nele encantava: os seus modos delicados e gentis, a modéstia no falar, o sorriso benévolo que lhe aflorava os lábios, o garbo com que se sabia ver em circunstâncias mais solenes, os sentimentos nobres que dominam em todo o seu proceder. Aos seus mestres devotava sempre a máxima estima e profunda gratidão. Das práticas de piedade era rígido observador e com regularidade frequentava os santos Sacramentos. Não há dúvida que, dada a ocasião, o seu génio impetuoso e quente o levava a transportes de veemência e de cólera. Mas estes excessos eram sempre seguidos de lágrimas de arrependimento e de penitência.

Desde a sua infância mostrou devoção particular a Nossa Senhora das Dores, uma imagem da qual se conservava em sua família; e cabia-lhe a ele adorná-la de flores e manter acesa uma lâmpada diante da estátua. Afirma um dos seus irmãos, Eurique Possenti, que viu Francisco, no último ano que passou em casa, usar de cilício de couro com pontinhas de ferro. Outro testemunho, da família Parenzi, declara: 

“A sua conduta religiosa e moral tem sido irrepreensível; dada a grande vigilância deosmeus pais, não teria sido admitido em nossa família, se não fosse realmente virtuoso”. 
 
Para completar a imagem do jovem estudante, e assim melhor poder compreender a mudança que nele mais tarde se efectuou, há que ter em conta a descrição da solene distribuição de prêmios, da última em que Francisco tomou parte no colégio dos Jesuítas em Spoleto, em setembro de 1856. Os melhores alunos tinham sido escolhidos para abrilhantar a cerimónia com discursos e declamações poéticas. Entre eles, Francisco ocupava o primeiro lugar. Ninguém se lhe igualava em elegância exterior, no garbo de representar, na graça de declamar, na graciosidade da gesticulação, no timbre encantador da voz. Podendo representar no palco, parecia estar no seu elemento e fazia-o com toda a naturalidade e perfeição. 

A sua aparência não deixava nada a desejar: tudo obedecia às exigências da última moda: o cabelo esmeradamente penteado, o traje elegante e ricamente adornado, as luvas brancas, gravata de seda, sapatos luzidios e artisticamente acabados, a tudo isso Francisco ligava máxima importância. Em certa ocasião, recitou com tanto ardor e tamanho foi o entusiasmo que excitou no auditório, que o delegado apostólico Mons. Guadalupe, que presente se achava, disse ao pai de Francisco que ao seu lado se achava: “se vosso filho aqui presente estivesse, abraçava-o em vosso lugar”.

As raras qualidades morais que o adornavam, a figura simpática e atraente na flor da mocidade, a extrema vivacidade que nele se observava, não deixaram de emprestar-lhe um leve sombreado de vaidade, que de algum modo chegou a dominá-lo. Esta vaidade se lhe patenteava na exigência que fazia no modo de se trajar, sempre na última moda, de perfumar o cabelo e este sempre tratado com cuidado, de se aborrecer com uma nódoa por mais insignificante que fosse no fato (roupa), no amor que tinha a divertimentos alegres e aos desportos mundanos.

O inimigo das almas tirou proveito dessas fraquezas. Se não conseguiu roubar-lhe a inocência, não foi porque não lhe poupasse contínuos assaltos, bem sucedidos. A paixão pelo teatro, a verdadeira mania por bailes, o amor à leitura de romances eram tantos escolhos, tantos perigos, que é de admirar que o jovem Francisco não caísse presa das ciladas diabólicas. Tão pronunciada era a sua paixão às danças, que lhe importou a alcunha de “bailarino”. Assim um dos seus mestres, Pe. Pinceli, Jesuíta, quando soube da inesperada fuga de Possenti do mundo para o convento, disse: “O bailarino fez isto? Quem esperava uma tal coisa! Deixar tudo e fazer-se religioso no noviciado dos Padres Passionistas!”.

Francisco bem conhecia o perigo em que nadava, e não faltava quem lhe chamasse a atenção, o lembrasse da necessidade da oração, da vigilância, da mortificação, da devoção a Jesus e Maria, de não perder de vista a Eternidade etc. Numa carta que lhe escreveu o Pe. Fedeschini, S.J., há todos estes avisos; o conselho de fugir das más companhias, de dar desprezo à vaidade no vestir e falar, de largar o respeito humano, de fazer meditação diária e receber os Sacramentos.

Com todas as leviandades e as suas perigosas tendências para o mundo, Francisco não deixava de ser um bom e piedoso jovem, a quem homens sábios e virtuosos não pudessem escrever com confiança, benevolência e estima e cujas palavras não fossem aceitas com respeito e gratidão.

“Muitas vezes” – diz quem bem o conhecia – “Possenti sentiu o chamado de Deus, de deixar a vida no mundo e trocá-la com o estado religioso”.

O seu director, Pe. Norberto, Passionista, declara:  

“A vocação, se bem que descuidada e sufocada, estava nele havia muito tempo, e ele a sentiu desde os mais tenros anos. Muitas vezes o servo de Deus disse-me isto, lastimando a sua ingratidão e indiferença”.

O mesmo sacerdote relata:  

“A sua vocação manifestou-se do seguinte modo: Não sei em que ano foi, sentiu-se ele acometido de um mal que o fez pensar na morte. Teve, então, a inspiração de prometer a Deus entrar numa Ordem religiosa, caso recuperasse a saúde. A promessa foi aceite, pois melhorou prontamente e em pouco tempo se achou restabelecido. Mas a promessa ficou como se não fosse feita. O jovem tornou a dar o seu afecto ao mundo e entregou-se à dissipação como antes. 

Não tardou que Deus lhe mandasse outra enfermidade, uma inflamação interna e externa da garganta, tão grave que parecia a morte iminente já na primeira noite, tornando-se-lhe dificílima à respiração. Novamente o enfermo recorreu a Deus e invocando Santo André Bobola, aplicou ao lugar dolorido uma estampa do mesmo Santo e renovou a promessa de abraçar o estado religioso. As melhoras surgiram quase instantaneamente, e teve o enfermo uma noite tranquila e não mais voltaram as angústias da dispneia. Deste extraordinário favor, o jovem lembrou-se sempre com muita gratidão. Manteve também por algum tempo o propósito de fazer-se religioso, mas diferindo-lhe a execução, o amor ao mundo voltou, e no mundo continuou a viver". 
 
Das paixões de Francisco, uma das mais fortes foi a da caça. A esta paixão ele pagava tributos bem pesados, e seu director espiritual não hesitou em atribuir a este desporto a cruel moléstia que o ceifou na flor da idade. Certa vez, ao pular uma cerca, chegou a cair e com tanta infelicidade que quebrou-lhe um osso do nariz. O fuzil disparou e o projétil passou-lhe rentinho pela testa, pouco faltando que lhe rebentasse o crânio. Francisco reconhecendo logo a providência deste aviso, renovou a sua promessa. Ficou com as cicatrizes, mas deixou-se ficar no mundo.

A graça divina também não se deu por vencida. Rejeitada três vezes, tentou um quarto golpe, mais doloroso ainda. De todos de sua família, Francisco dedicava terníssima amizade a sua irmã Maria Luzia, nove anos mais velha que ele, e esta amizade era correspondida com todo afecto. Em 1855 irrompeu em Spoleto a cólera, e Maria Luiza foi a primeira vítima da terrível epidemia. Foi no dia de “Corpus Christi”, e a notícia alcançou Francisco quando, na procissão, levava a cruz. A morte da irmã feriu profundamente o coração do jovem e mergulhou sua alma em trevas nunca antes experimentadas. Perdeu o gosto de tudo e se entregou a uma tristeza inconsolável. Parecia que com este golpe a graça divina tivesse removido o último obstáculo de a promessa se cumprir. 

Assim ainda não foi. Todo acabrunhado, Francisco manifestou ao pai sua resolução de entrar para o convento chegando a dizer que para ele tudo se tinha acabado nesta vida. Possenti, receando perder o seu filho a quem muito amava, não recebeu bem a comunicação e pediu-lhe nunca mais tocasse neste assunto. Aconselhou-o a se distrair, a afastar os pensamentos tristes, a procurar a sociedade, frequentar o teatro; chegou a insinuar-lhe a ideia de procurar a amizade de uma donzela distinta, de família igualmente conceituada, na esperança de, nos entendimentos inocentes, ela conseguir fazê-lo esquecer-se dos seus intentos religiosos. 

Na igreja metropolitana de Spoleto, gozava de uma veneração singular uma imagem de Nossa Senhora; a esta imagem chamava simplesmente “a Ícone”. Na oitava do dia 15 de Agosto, esta imagem era levada em solene procissão por dentro da igreja, e não havia quem não se ajoelhasse à sua passagem. Em 1856, Francisco Possenti achava-se no meio dos fiéis e, todo tomado de amor por Maria Santíssima, os seus olhos fixavam-se na venerada imagem como que esperando por uma bênção especial. Pois, quando a “Ícone” vinha aproximando-se do jovem, parecia que Ela lhe atirava um olhar todo especial e lhe dizer: “Francisco, o mundo não é para ti; a vida no convento espera-te”. Esta palavra, qual uma seta de fogo, cravou-lhe no coração; assim, saiu da igreja desfeito em lágrimas. Estava resolvido a realizar desta vez o plano de alguns anos. Tratou, porém, de não dar, por enquanto, nenhuma demonstração do seu intento.

Embora certo da sua vocação, mas desconfiando da sua fraqueza, e para não ser vítima de uma ilusão, procurou o seu mestre no liceu e director espiritual Pe. Bompiani, Jesuíta, e a ele abriu-se inteiramente, fazendo do conselho deste depender a sua resolução definitiva.

O exame foi feito com toda sinceridade, e tendo tomado em consideração todos os factores influentes no passado da vida do jovem, o Pe. Bompiani não duvidou de se tratar de uma vocação verdadeira e animou o jovem a segui-la. Consultas que fez com mais dois sacerdotes da sua inteira confiança tiveram o mesmo resultado. Francisco resolveu então a pedir a sua admissão na “Congregação dos Passionistas”.

Comunicar ao pai a resolução tomada, não foi fácil. Mas desta vez o Sr. Sante, homem consciencioso, vendo a aflição e a firmeza do seu filho, não mais se opôs; tomado, porém, de espanto quando soube que a Congregação por Francisco escolhida, a dos Passionistas, era de todas a mais austera. Se bem que não se opusesse à vontade do filho, tratou de procrastinar a execução do seu plano e impor condições. 

Francisco, porém, ficou firme. Tomou, ainda e pela última vez, parte na solenidade da distribuição dos prémios no colégio dos Jesuítas, fez como sempre um papel brilhante no palco, despediu-se dos seus professores, dos seus amigos e, em companhia de seu irmão Luiz, da Ordem Dominicana, por ordem de seu pai, fez uma visita ao seu tio Cesare, cónego da Basílica de Loreto, e a um parente de seu pai, Frei João Baptista da Civitanova, guardião de um convento dos capuchinhos, levando para ambos carta de Sante Possenti em que este pedia examinassem a vocação do jovem. Tanto o cónego como o capuchinho carregaram bastante as cores da vida austera na Congregação dos Passionistas, que absolutamente não lhe conviria, a ele, moço de dezoito anos, acostumado a seguir as suas vontades, sem restrição de comodidades.  

Quando da visita à Santa Casa, em Loreto, Francisco aproveitou largamente para recomendar-se a Nossa Senhora. Não mais arredou do caminho encetado. De Loreto foi para Convento Morrovale, dos Passionistas, onde em 21 de Setembro de 1856 recebeu o hábito com o nome de Gabriele dell’Adolorata (Gabriel de Nossa Senhora das Dores). Admitido no noviciado, escreveu ao pai e aos irmãos comunicando-lhes o fato. Ao pai, pede perdão; aos irmãos recomenda amor filial e boa conduta. A carta, embora de simplicidade encantadora, é um documento admirável de sentimento filial e católico. Aos companheiros seus de estudo, dirigiu cartas também. Despede-se, pede perdão de maus exemplos que julgava ter dado; aconselha-os a fugir das más companhias, do teatro, das más leituras e das conversas inúteis.

Convencidíssimo da sua vocação religiosa, longe do mundo, da sociedade e da família, não mais teve outro ideal que subir às culminâncias da perfeição.

Inconfundível era sua personalidade no meio dos seus companheiros do noviciado. Sem perder as notas características do seu carácter, a jovialidade, a alegria de espírito, a amenidade de trato, era ele inexcedível não só na exatidão do cumprimento dos exercícios regulares, como também na prática das virtudes cristãs e monásticas. E, se perscrutarmos as causas profundas desta mudança radical na vida de Gabriel, duas conseguiremos encontrar, aliás suficientes e esclarecedoras: o ardente amor a Jesus Crucificado e à Santa Eucaristia, a sua devoção singular à Mãe de Deus (em particular a Nossa Senhora das Dores) e a sua inalterada mortificação, por meio da qual deu morte aos seus desordenados apetites, um por um.

Tendo corrido o ano de provação, Gabriel foi admitido à profissão e mandado para várias casas da Congregação, com o fim de completar os seus estudos de Teologia. Durante os anos de preparação para o sacerdócio, superiores e companheiros viram no santo jovem o modelo mais perfeito de todas as virtudes, e cumpridor exatíssimo dos seus deveres.

Quando chegou à idade de vinte e três anos, anunciaram-se os primeiros sintomas da moléstia que no prazo de um ano havia de levá-lo ao túmulo: a tuberculose pulmonar. O longo tempo da sua enfermagem, Gabriel aproveitou-o para ainda mais se aprofundar na sua devoção predileta à Sagrada Paixão e Morte de Jesus Cristo e a Maria Santíssima, Mãe das dores

Em Fevereiro de 1862, ainda pôde andar e receber a santa Comunhão na igreja, junto com os seus companheiros. Inesperadamente o mal se agravou; foi preciso avisá-lo para receber os últimos sacramentos. A notícia assustou-o por um momento só; mas imediatamente recuperou a habitual calma, que logo se transformou numa alegria antes nunca experimentada. O modo de receber o santo Viático comoveu e edificou a todos que assistiram. Não mais largava a imagem do Crucificado, que cobria de beijos, e ao seu alcance tinha a estátua de Nossa Senhora das Dores, que frequentemente apertava ao seu peito, proferindo afetuosas jaculatórias, como estas:

“Minha mãe, faze depressa!”
“Jesus, Maria, José, expire eu em paz em vossa companhia!”
“Maria, mãe da graça, mãe da misericórdia, do inimigo nos protegei, e na hora da morte nos recebei”.

Poucos momentos antes do desenlace, o agonizante, que parecia dormir, de repente, todo a sorrir, virou o rosto para esquerda, fixando olhar para um determinado ponto. Como que tomado de uma grande comoção diante de uma visão impressionante, deu um profundo suspiro de afecto e nesta atitude, sempre sorridente, com as mãos apertando as imagens do Crucifixo e da Mater Dolorosa, passou desta vida para a outra.

Assim morreu o santo jovem na idade de vinte e quatro anos, na manhã de 27 de Fevereiro de 1862. Foi sepultado na igreja da Congregação, em Isola Del Gran Sasso. Trinta anos depois fez-se o reconhecimento do seu corpo. Nesta ocasião, com o simples contacto de suas relíquias verificou-se a cura prodigiosa de uma jovem que a tuberculose pulmonar tinha reduzido ao último estado. Reproduziram-se aos milhares os prodígios que foram constatados à invocação do Santo.

Em 1908 o Papa Pio X inscreveu o nome de Gabriel da Virgem Dolorosa (ou de Nossa Senhora das Dores) no catálogo dos Beatos, e, em 1920, Bento XV decretou-lhe as solenes honras da Canonização. Pio XI estendeu a sua festa a toda a Igreja, em 1932.


ORAÇÃO

Ó Deus, que ensinastes a São Gabriel a honrar com assiduidade as dores de vossa Mãe dulcíssima, e por Ela o elevaste à glória da Santidade e dos milagres, concedei-nos, pela sua intercessão e seus exemplos, a graça de partilharmos tão intimamente as dores de Vossa Mãe Santíssima e que, por sua maternal proteção, consigamos a salvação eterna.


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