quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Lições do Prof. Cavaco Silva - Catarina Nicolau Campos

Tenho que confessar que ao longo destes (infindáveis) anos de mandato, tenho aprendido muita coisa com o Professor Cavaco Silva.

Em primeiro lugar, que uma pessoa por vezes não é o que parece. E por isso o voto para umas Eleições Presidenciais passou a ter todo um novo significado: significa que nunca se deve confiar em ninguém, e há que investigar e conhecer muito bem a pessoa que procuramos eleger para Presidente da República; caso contrário sou mesmo da opinião que mais vale não votar ou votar em branco (que no sistema eleitoral português, efectivamente, é quase o mesmo).

Em segundo lugar, que o cargo de Presidente da República, ao invés do que eu julgava, implica uma separação total entre o cargo e a pessoa que o ocupa. Entenda-se, o cargo institucional nunca deve ser influenciado pelas crenças, valores, atitudes da Pessoa que o exerce. Que é como quem diz, tanto faz quem lá está. Eu achava que era indissociável, e por essa razão é que escolhíamos um ou outro candidato, mas pelos vistos assim não sucede: o Presidente é um, o Aníbal é outro. Coisa formidável, aliás, até mesmo porque nunca tinha conhecido humano algum capaz de tal frieza e imparcialidade. Um louvor para o senhor Professor!

Em terceiro lugar, que o Presidente não é a pessoa que ocupa o cargo, são os acessores que contrata. E por isso, corolário do que já foi afirmado, a pessoa em quem votamos nunca a pessoa que verdadeiramente exerce as funções para a qual foi eleita.

Outra coisa que descobri com o Professor Cavaco Silva, é que se há coisa que se deve ter em conta, essa coisa é decididamente a forma, a maneira como se executam as acções de cada dia. De suma importância esta forma, que se reflectiu primeiramente na intervenção estival "tchanan!" sobre o Estatuto dos Açores, somou e seguiu, e que por último serviu de justificação para o veto do diploma sobre GPL e gás natural: veio devolvido para a Assembleia, porque o texto era "juridicamente duvidoso".

Para quem teve problemas em vetar leis mais importantes, humanamente duvidosas, digamos que é no mínimo de estranhar tanta precisão e exigência com matéria combustível.

Por isso, não duvido quando digo que Cavaco Silva foi o pior Presidente da República na História de Portugal. Como é possível que não tenha invocado o veto para questões tão importantes como o aborto, a procriação medicamente assistida, a lei do divórcio simplex, o casamento homossexual???? Questões fracturantes, que mereciam uma tomada de posição de quem rege os destinos do país...mas que, na altura, questionado quanto ao veto, apenas soube responder que a sua vontade não se deveria sobrepôr à da Assembleia, que é o órgão democrático por excelência.

Lamento tudo isto. Não só as incontáveis mortes pelas quais este senhor se tornou responsável - sem dramatismos, pura verdade - , mas lamento também, e profundamente, que os diplomas do aborto, da procriação medicamente assistida, do divórcio, etc, tenham sido redigidos por juristas competentes e capazes, que não cometeram erros ortográficos, nem atentaram contra os princípios constitucionais - pelo menos a nível da forma.

Tivessem sido estes juristas escribas desleixados e talvez a História se escreveria de outra forma.


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4 comentários:

joaquim disse...

Nem mais! Assino por baixo!

Um abraço

Pyny disse...

Não concordando com a acção de Cavaco Silva nas leis aprovadas, acho que é muito forte, e historicamente incorrecto, dizer que Cavaco Silva foi o pior Presidente da República Portuguesa. Vejam-se os Presidentes da 1ª República apenas a título comparativo e as atrocidades cometidas em nome da "suposta" liberdade religiosa.

Catarina Nicolau Campos disse...

Pyny, as atrocidades cometidas durante a 1ª República faziam parte da agenda maçónica da época. Sem dúvida que não foram bons esses Presidentes e que tudo o que a Igreja sofreu é de lamentar profundamente, e enquanto católica repudio veementemente todas essas acções.

Agora, Cavaco Silva conseguiu ser bem pior que os nossos Presidentes da 1ª metade do século.

Dou-lhe apenas 2 exemplos:

1. Cavaco Silva foi conivente com a lei do aborto.
Por dia, em Portugal, depois da lei, 53 crianças não nascidas são mortas por sucção, salinização, etc. Já sentem o que se passa, sofrem, têm um coração que bate como o seu e o meu, e são brutalmente assassinadas. 53 bebés por dia. E Cavaco Silva é indirectamente responsável por esta barbárie.
Consegue arranjar pior que isto na 1ª República? Eu não.

2. Cavaco Silva foi conivente com a lei do divórcio.

A lei do divórcio, que entre bons juristas é também conhecida como a lei do repúdio, torna o casamento o contrato como menos garantias que a lei prevê.
Um mero contrato com uma empregada de limpeza tem mais garantias do que o contrato civil que eu celebrei com o meu marido.
Cavaco Silva tornou-se co-responsável pela destruição de milhares de famílias, e por muitas outras consequências dramáticas que resultam desta lei e que os tribunais bem conhecem.

Repare, Pyny: não são atrocidades pontuais. São continuadas, revestidas de lei justa, que todos os dias se repetem e que têm consequências irreversíveis.

Pyny disse...

Catarina, continuo a não concordar! Por muito grave que me pareça o seu primeiro ponto repare-se que na 1.ª República num espaço de um três mesesse fez o seguinte em termos de legislação:
De Outubro de 1910 até Dezembro, foram laicizados os feriados religiosos, abolido o juramento religioso em tribunal e na universidade, extinto o ensino da doutrina cristã nas escolas primárias, instituído o divórcio, suprimida a cadeira de direito eclesiástico português e instituído o casamento civil como o único válido perante o Estado português, culminando esta série de decretos na promulgação da Lei de Separação da Igreja e do Estado a 20 de Abril de 1911.
Para além disto, todos os bens das ordens religiosas foram declarados pertença do Estado e os padres passaram a ter de "mendigar" um salário à República, o que foi bastante controverso. Houve perseguições e prisões às mãos de um só homem: Afonso Costa! Enquanto presidente do Partido Republicano Português governou Portugal, mesmo quando não era chefe de Governo, como foi salientado por Vasco Pulido Valente na sua tese de doutoramento! Afonso Costa não foi conivente com as leis do parlamento, mas foi por sua mão que estas leis foram produzidas! Não quero com isto dizer que defendo as acções do Prof. Cavaco Silva, com as quais não concordo, mas parece-me que, apesar de tudo, ter uma agenda de destruição e perseguição e "lavar as mãos" são crimes de diferente categoria. Não lhe parece?