segunda-feira, 9 de maio de 2022

Elogio fúnebre de S. Gregório Nazianzeno no enterro do seu grande amigo S. Basílio Magno

Encontrámo-nos em Atenas, como que arrastados pela corrente de um mesmo rio, que desde a fonte pátria nos tinha dispersado por diversas regiões (para onde éramos atraídos pelo afã de aprender), e que, de novo, como se nos tivéssemos posto de acordo, nos voltou a reunir, sem dúvida porque assim Deus o quis.
   
Por aquele tempo, eu não só admirava o meu grande amigo Basílio, pela seriedade dos seus costumes e pela maturidade e prudência das suas palavras, mas tratava de persuadir a outros que ainda não o conheciam, para que tivessem a mesma admiração. Começou a ser tido em grande estima, até por aqueles que lhe levavam vantagem em fama e audiência.

Que sucedeu então? Ele foi o único, entre todos os estudantes que se encontravam em Atenas, a ser dispensado da lei comum e o único a conseguir uma honra maior do que a que normalmente corresponde a um discípulo. Este foi o prelúdio da nossa amizade; este o incentivo da nossa intimidade; assim nos prendemos um ao outro pelo afecto mútuo.

Com o andar do tempo, confessámos mutuamente as nossas intenções e compreendemos que o nosso mais profundo ideal era o amor da sabedoria; e desde então, éramos um para o outro o mais possível companheiros e amigos, sempre de acordo, aspirando aos mesmos bens e cultivando cada dia mais fervorosa e firmemente o nosso ideal comum.

Movia-nos a mesma ânsia de saber; embora isto costume ocasionar profundas invejas, nós não tínhamos inveja; em contrapartida, tínhamos em grande apreço a emulação. Lutávamos entre nós, não para ver quem era o primeiro, mas para ver quem cedia ao outro a primazia; cada um de nós considerava como própria a glória do outro.

Parecia que tínhamos uma só alma em dois corpos. E embora não se deva dar crédito àqueles que dizem que tudo se encontra em todas as coisas, no nosso caso podia afirmar-se que realmente cada um se encontrava no outro e com o outro.

Uma só tarefa e um só objectivo havia para ambos: aspirar à virtude, viver para as esperanças futuras e comportar-nos de tal modo que, mesmo antes de ter partido desta vida, tivéssemos emigrado dela. Esse foi o ideal que nos propusemos, e assim tratávamos de orientar a nossa vida e as nossas acções, em atitude de docilidade aos mandamentos divinos, entusiasmando-nos mutuamente à prática da virtude; e, se não parecer demasiada arrogância, direi que éramos um para o outro a norma e a regra para discernir o bem do mal.
   
E assim como outros têm sobrenomes recebidos de seus pais, ou adquiridos por si próprios, isto é, com a actividade e a orientação da sua vida, para nós o maior título de glória era sermos cristãos e como tal reconhecidos. 

Oratio 43 in 'Laudem Basilii Magni'


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2 comentários:

Anónimo disse...

Que pena isso se dar tão pouco... será Deus que não quer, ou as pessoas não querem?

Maria José Martins disse...


"Quem encontra um Amigo, encontra um TESOURO!"
E tal como na vida de outros Grandes Místicos, Deus permitiu que este dois Santos se encontrassem, para que juntos caminhassem para Ele, ajudando-se mutuamente, tendo-O sempre como primeira Referência e Objetivo a atingir.
E, segundo li algures, é assim que age, quando alguém se predispõe a segui-Lo de Verdade: Deus coloca sempre uma alma gémea ao nosso lado, para que consigamos reforçar, nos momentos mais difíceis, as nossas mais Santas aspirações; Ele nunca nos deixa sozinhos!

E, agora, me desculpem se vou dizer algum disparate: não deveriam ser assim todas as relações?
Já imaginaram como seriam "quase" perfeitas as famílias, cujos cônjuges assim procedessem, deixando que Deus completasse todas as suas limitações, depois de TUDO fazerem por Ele?