Um enfraquecimento da fé e a diminuição do número de fiéis podem ser atribuídos aos abusos litúrgicos e às Missas mal celebradas, quer dizer, as que traem o seu sentido original e onde, no centro, já não está Deus, mas o homem, com a bagagem de suas perguntas existenciais. Essa é uma ideia sustentada por Nicola Bux, teólogo e consultor da Congregação para a Doutrina da Fé e do Ofício de Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice.
Bux replica a quantos criticaram Bento XVI, acusando-o de ter traído o espírito conciliar. Ao contrário – argumenta o teólogo – os documentos oficiais do Concílio Vaticano II foram traídos precisamente por essas pessoas, bispos e sacerdotes à frente, que alteraram a liturgia com “deformações ao limite do suportável”.
Participar de uma celebração eucarística pode significar encontrar-se com as formas litúrgicas mais estranhas, com sacerdotes que discutem economia, política e sociologia, tecendo homilias em que Deus desaparece. Proliferam os ensaios de antropologia litúrgica até reduzir a esta dimensão os próprios sinais sacramentais, “agora chamados preferivelmente de símbolos”. A questão não é pequena: enfrentá-la implica ser tachado de anticonciliar.
Todos se sentem com o direito de ensinar e praticar uma liturgia “ao seu modo”, tanto que hoje é possível assistir, por exemplo, “à afirmação de políticos católicos que, considerando-se ‘adultos’, propõem ideias de Igreja e de moral em contraste com a doutrina”.
Entre aqueles que iniciaram esta mudança, Bux recorda Karl Rahner, quem, à raiz do Concílio, denunciava a reflexão teológica então imperante que, em sua opinião, mostrava-se pouco atenta ou esquecida da realidade do homem. O jesuíta alemão sustentava em contrapartida que todo discurso sobre Deus brotaria da pergunta que o homem lança sobre si mesmo. Em consequência – esta é a síntese – a tarefa da teologia deveria ser falar do homem e de sua salvação, lançando as perguntas sobre si e sobre o mundo. Um pensamento teológico que, com triste evidência, foi capaz de gerar erros, o mais clamoroso dos quais é o modo de entender o sacramento, hoje já não sentido como procedente do Alto, de Deus, mas como participação em algo que o cristão já possui.
A liturgia é sagrada se tiver suas regras. Apesar disso, se por um lado o ethos, ou seja, a vida moral, é um elemento claro para todos, por outro lado, ignora-se quase totalmente que existe também um “jus divinum”, um direito de Deus a ser adorado. “O Senhor é zeloso de suas competências – sustenta Bux –, e o culto é o que lhe é mais próprio. Em contrapartida, precisamente no campo litúrgico, estamos frente a uma desregulação”.
Sublinhando, em contrapartida, que sem “jus” o culto torna-se necessariamente idolátrico, em seu livro o teólogo cita uma passagem da “Introdução ao espírito da liturgia”, de Ratzinger, que escreve: “Na aparência, tudo está em ordem e presumivelmente também o ritual procede segundo as prescrições. E no entanto é uma queda na idolatria (...), faz-se Deus descer ao nível próprio, reduzindo-o a categorias de visibilidade e compreensibilidade”.
E acrescenta: “trata-se de um culto feito à própria medida (...), converte-se em uma festa que a comunidade faz para si mesma; celebrando-a, a comunidade não faz mais que confirmar a si mesma”. O resultado é irremediável: “Da adoração a Deus se passa a um círculo que gira em torno de si mesmo: comer, beber, divertir-se”. Em sua autobiografia (Mi vida), Ratzinger declara: “Estou convencido de que a crise eclesial em que hoje nos encontramos depende em grande parte do colapso da liturgia”. in Zenit
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