segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Regras espirituais para um Padre que aspire à perfeição (II)

4. Intenção de fazer tudo por Deus

Em todas as suas acções, deve o padre ter a intenção de tudo fazer só para Deus. Os mestres da vida espiritual chamam à recta intenção uma alquimia celeste, que converte em ouro todas as nossas acções, mesmo as que respeitam às necessidades corpóreas, como o repouso, o alimento e o recreio.

Mas, em especial, é necessário que os exercícios de piedade se façam unicamente para agradar a Deus, e não por motivo de interesse, vanglória, ou gosto próprio; de contrário, tudo se perderá e, em vez de recompensa, se receberá castigo. Para com segurança pois, se fazer por Deus tudo quanto se fizer, convém que se obre sempre sob a dependência dum director.

5. Amor da solidão e do silêncio

É preciso que o padre ame a solidão e o silêncio. Quem trata e fala demasiado com os homens, necessita de tomar cautela; se a não tiver, dificilmente evitará o pecado: In multiloquio non deerit peccatum (Prov. 10, 10). Por isso o Senhor disse: In silentio et in spe erit fortitudo vestra (Ps. 30, 15).

Seremos fortes contra as tentações, na medida em que confiarmos em Deus, e nos afastarmos do comércio com as criaturas. De mais, quem fala muito com os homens, falará pouco com Deus. Na solidão fala e conversa familiarmente o Senhor com as almas, conforme esta exclamação de S. Jerónimo: O solitudo, in qua Deus cum suis familiariter loquilur ac conversatur!

E o próprio Deus nos faz compreender que é na solidão que nos fala aos corações: Ducam eam in solitudinem, et loquar ad cor ejus (Os. 2, 14). As almas que ardem no amor de Deus sempre buscam a solidão: é o que se observa. Corriam os santos a esconder-se nas florestas e em espantosas cavernas, para não serem perturbados pelo ruído do mundo e poderem tratar a sós com Deus. O silêncio e a solidão forçam, por assim dizer, a alma a não pensar senão em Deus.

No entanto, não consiste a virtude em estar sempre calado, mas em falar quando convém. Um bom padre cala-se quando deve calar-se, e fala quando deve falar; mas fala somente de Deus, ou do que interessa à glória de Deus e ao bem das almas. Muitas vezes uma palavra de Deus, dita familiarmente em conversa ou a um amigo, produzirá mais fruto que muitos sermões.

Deve-se pois ter cuidado em todos os entretenimentos, por indiferentes que sejam, de misturar alguma palavra edificante sobre as verdades eternas ou sobre o amor de Deus. Quando se ama uma pessoa, sempre se desejaria falar e ouvir falar dela; quando se ama a Deus, só se fala e quer ouvir falar de Deus.

6. Conformidade com a vontade de Deus

Consiste acima de tudo o amor de Deus na conformidade com a sua santa vontade, especialmente nas coisas que mais contrariam o amor próprio, como são as doenças, a pobreza, o desprezo, as perseguições e as securas espirituais. Devemos estar persuadidos de que tudo isso, que nos advém de Deus, nos é útil, por ser feito ou permitido para nosso bem; porque ninguém há que mais nos ame do que Deus. Se queremos santificar-nos, digamos em tudo quanto nos acontecer: Fiat voluntas tua. Sit nomen Domini benedictum. Domine, quid me vis facere? Sicut Domino placuit, ita factum est. Ita, Pater! quoniam sic fuit placitum ante te.

Em todas as eventualidades da vida, agradáveis ou desagradáveis, procuremos conservar essa paz contínua, essa tranqüilidade inalterável de que os santos nos dão exemplo, dizendo sempre: In pace in idipsum dormiam et requiescam. Uma alma que ama a Deus passa uma vida uniforme, sempre em união com o Senhor; era o que nos seus cânticos exprimia um grande servo de Deus, o cardeal Petrucci, sobre esta palavra do Espírito Santo: Non contristabit justum quidquid ei acciderit (Prov. 12, 21).

Assim, um padre que ama a Deus jamais será abalado pela aflição. Só o pecado lhe deve causar dor; mas esta dor mesmo, como acima dissemos, deve ser uma dor calma, que não perturbe a paz da alma.
Santo Afonso-Maria de Ligório in A Selva


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