domingo, 29 de janeiro de 2017

O surrealismo e a confissão

Muitos meios de comunicação social têm dificuldade em perceber a Igreja, porque parece que ela não fala do dia-a-dia real. Faz lembrar aqueles artistas dos anos 20 que rejeitavam a chamada «ditadura da razão» e lhe contrapunham o sonho, a falta de lógica. A inconsistência dos surrealistas dos anos 20 gerava momentos de humor e, realmente, nada daquilo era para ser levado a sério ainda que, frequentemente, fosse muito divertido.

Hoje em dia, muitos jornalistas estão convencidos de que a Igreja também vive numa nuvem de sonhos, irrealista, «acima da realidade», como proclamavam os surrealistas com o seu humor muito especial. O discurso da Igreja tem alguma coisa a ver com os problemas do mundo em que vivemos?

No meio de tantas convulsões, o Papa Francisco está focado no sacramento da Confissão!
Das primeiras vezes, as pessoas estranharam. Com a insistência, muitos estão perplexos. Neste momento, os jornalistas já não sabem se devem dar a notícia ou se é a brincar.

Na Carta Apostólica com que encerrou o Ano da Misericórdia, o Papa Francisco estabelece que «o sacramento da Reconciliação precisa de voltar a ter o seu lugar central na vida cristã». Em cada parágrafo, aparece uma referência a este «caminho que somos chamados a percorrer». «A misericórdia constitui a própria existência da Igreja. Tudo se revela na misericórdia; tudo se compendia no amor misericordioso do Pai». «O perdão é o sinal mais visível do amor do Pai, que Jesus quis revelar em toda a sua vida». «Nada que um pecador arrependido coloque diante da misericórdia de Deus pode ficar sem o abraço do seu perdão». «Agora, concluído este Jubileu, é tempo de olhar para diante e compreender como se pode continuar, com fidelidade, alegria e entusiasmo, a experimentar a riqueza da misericórdia divina». «Não limitemos a força renovadora da misericórdia; não entristeçamos o Espírito». «Mantenhamos o coração aberto à confiança de ser amados por Deus. O seu amor sempre nos precede, acompanha e permanece connosco, não obstante o nosso pecado». «O sacramento da Reconciliação é o momento em que sentimos o abraço do Pai, que vem ao nosso encontro para nos restituir a graça de voltarmos a ser seus filhos».
«Recebi muitos testemunhos de alegria pelo renovado encontro com o Senhor no sacramento da Confissão. Não percamos a oportunidade de viver a fé, inclusive como experiência da reconciliação. “Reconciliai-vos com Deus”: é o convite que ainda hoje dirige o Apóstolo a cada crente».

Nesta carta e nas homilias do Santo Padre, vejam-se as da última semana, há um apelo muito forte aos padres para que dediquem horas ao confessionário: «Aos sacerdotes, renovo o convite para se prepararem com grande cuidado para o ministério da Confissão, que é uma verdadeira missão sacerdotal». «O sacramento da Reconciliação precisa de voltar a ter o seu lugar central na vida cristã; para isso requerem-se sacerdotes que ponham a sua vida ao serviço do “ministério da reconciliação”». «Agradeço-vos vivamente (...) e peço-vos para serdes acolhedores com todos, testemunhas da ternura paterna não obstante a gravidade do pecado, solícitos em ajudar a reflectir sobre o mal cometido, claros ao apresentar os princípios morais, disponíveis para acompanhar os fiéis no caminho penitencial (...), generosos na concessão do perdão de Deus». «Nós, confessores, temos experiência de muitas conversões que ocorrem diante dos nossos olhos. Sintamos, portanto, a responsabilidade de gestos e palavras que possam chegar ao fundo do coração do penitente».

Seria impossível enunciar todas as vezes em que o Papa pede aos católicos para se confessarem e aos padres para estarem disponíveis.


Que Deus continua a ser o mais importante parece tão fora da realidade comum que os próprios católicos se surpreendem. Não admira que muitos jornais não saibam informar sobre um discurso tão surrealista. Resta saber se os católicos também olham para o Papa como se fosse um surrealista.

José Maria C.S. André in Correio dos Açores, 29-I-2017


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1 comentário:

A disse...

De repente lembro mais gente além da comunicação social com dificuldade em perceber a Igreja… e quem é a Igreja? Parece que ela não fala do dia-a-dia real… Se do altar o padre conclui que os animais são coisas, não deve ser de todo levado a sério… ou teria de pertencer a outra igreja menos surrealista, se os padres fossem sempre igreja sem uma forma de ver o mundo muito objetiva e limitada contrapondo à arte libertadora das exigências da razão e rumo à imaginação castrada pelo utilitarismo dos valores da religião, família… Ela não deve ser levada a sério…! Mas afinal será que a Igreja se lhe assemelha numa nuvem de sonhos? O discurso da Igreja tem alguma coisa a ver com os problemas do mundo em que vivemos? Elas respondem…. iam a sair da igreja caminhando pela noite dentro. Este padre é que devia cá estar sempre, ai o padre Xpto é uma coisa tão antigo, tão antigo… (queriam dizer uma espécie de discurso e postura surrealista…) Olho para elas. Surpreendo-me diria que eram bastante idosas. Se velhas pensam assim que fará as novas. Não era suposto serem as velhas a defender a tradição? Aquela que ficou atrás da arte de Dali ?_ Não acha?_ pergunta-me uma. Abstenho-me de comentar… lá terá as suas qualidades… o padre pelo menos até dedica horas ao confessionário, preparado com o cuidado necessário para o ministério da Confissão? Só ele sabe, mas fá-lo voltar a ter o seu lugar central, mas afinal nem isso o salva… e porque é que tão boa qualidade não é peso em conta? Os próprios católicos se surpreendem com missas tão cubistas que os (as) deixa quadradas…